É
relativamente comum encontrar cristãos que temem dar crédito à Ciência por
acreditar que isso seria colocar a sabedoria humana acima da sabedoria de Deus.
Geralmente, dizem que precisamos confiar na Bíblia como a revelação de Deus.
Por outro lado, com frequência, se apoiam em textos produzidos por teólogos,
filósofos e outros para compreender o sentido das Escrituras. Será que a Bíblia
é a única revelação que temos de Deus? Foi a primeira? Se acreditamos que houve
um Criador, não devemos acreditar que as obras criadas revelam algo sobre Ele?
Que elas possam apresentar Sua assinatura pessoal? E que o processo de entender
e desvendar a natureza deveria revelar Sua assinatura? A Bíblia está repleta de
apelos para que se observe a natureza para melhor compreender as lições
espirituais. Vejamos o que está escrito no livro mais antigo da Bíblia:
“Mas,
pergunta agora às alimárias, e elas te ensinarão; e às aves do céu, e elas te
farão saber; ou fala com a terra, e ela te ensinará; até os peixes o mar to declararão.
Qual dentre todas estas coisas não sabe que a mão do Senhor fez isto?” (Jó
12:7-9).
“Quem
é este que escurece o conselho com palavras sem conhecimento? Agora cinge os
teus lombos, como homem; porque te perguntarei, e tu Me responderás. Onde estavas
tu, quando Eu lançava os fundamentos da terra? Faze-mo saber, se tens
entendimento. Quem lhe fixou as medidas, se é que o sabes? Ou quem a mediu com
o cordel? Sobre que foram firmadas as suas bases, ou quem lhe assentou a pedra
de esquina, quando juntas cantavam as estrelas da manhã, e todos os filhos de
Deus bradavam de júbilo?” (Jó 38 e 39).
Esses
dois capítulos inteiros (12 e 38) apontam para as obras da natureza como forma
de se entender a justiça de Deus. Foi a resposta de Deus a Jó depois da longa
discussão teológica entre ele e seus amigos sobre a justiça divina.
Outros
livros do Antigo Testamento nos convidam a considerar a grandeza de Deus
através dos mundos e sóis que Ele criou:
“Os
céus proclamam a glória de Deus e o firmamento anuncia a obra das Suas mãos. Um
dia faz declaração a outro dia, e uma noite revela conhecimento a outra noite.
Não há fala, nem palavras; não se lhes ouve a voz. Por toda a terra estende-se
a sua linha, e as suas palavras até os confins do mundo” (Salmo 19:1-4).
“A
quem, pois, Me comparareis, para que Eu lhe seja semelhante?, diz o Santo.
Levantai ao alto os vossos olhos, e vede: quem criou estas coisas? Foi aquele
que faz sair o exército delas segundo o seu número; Ele as chama a todas pelos
seus nomes; por ser Ele grande em força, e forte em poder, nenhuma faltará” (Isaías
40:25, 26).
O
rei Salomão, considerado o homem mais sábio de seu tempo, não estudou os
filósofos da época, mas realizou pesquisas em Botânica e Zoologia:
“A
sabedoria de Salomão era maior do que a de todos os do Oriente e do que toda a
sabedoria dos egípcios. Era ele ainda mais sábio do que todos os homens, mais
sábio do que Etã, o ezraíta, e do que Hemã, Calcol e Darda, filhos de Maol; e a
sua fama correu por todas as nações em redor. Proferiu ele três mil provérbios,
e foram os seus cânticos mil e cinco. Dissertou a respeito das árvores, desde o
cedro que está no Líbano até o hissopo que brota da parede; também dissertou
sobre os animais, as aves, os répteis e os peixes. De todos os povos vinha
gente para ouvir a sabedoria de Salomão, e da parte de todos os reis da terra
que tinham ouvido da sua sabedoria” (1 Reis 4:30-34).
Os
provérbios e os cânticos que ele escreveu estão repletos de conselhos e imagens
extraídos da natureza. Abaixo estão uns poucos exemplos:
“O
Senhor pela sabedoria fundou a terra; pelo entendimento estabeleceu o céu. Pelo
seu conhecimento se fendem os abismos, e as nuvens destilam o orvalho” (Provérbios
3:19, 20).
“Mas
a vereda dos justos é como a luz da aurora que vai brilhando mais e mais até
ser dia perfeito” (Provérbios 4:18).
“Vai
ter com a formiga, ó preguiçoso, considera os seus caminhos, e sê sábio; a
qual, não tendo chefe, nem superintendente, nem governador, no verão faz a
provisão do seu mantimento, e ajunta o seu alimento no tempo da ceifa” (Provérbios
6:6-8).
“O
Senhor me criou como a primeira das Suas obras, o princípio dos Seus feitos
mais antigos. Desde a eternidade fui constituída, desde o princípio, antes de
existir a Terra. Antes de haver abismos, fui gerada, e antes ainda de haver
fontes cheias d’água. Antes que os montes fossem firmados, antes dos outeiros
eu nasci, quando Ele ainda não tinha feito a Terra com seus campos, nem sequer
o princípio do pó do mundo. Quando Ele preparava os céus, aí estava eu; quando
traçava um círculo sobre a face do abismo, quando estabelecia o firmamento em
cima, quando se firmavam as fontes do abismo, quando Ele fixava ao mar o seu
termo, para que as águas não traspassassem o seu mando, quando traçava os
fundamentos da terra, então eu estava ao Seu lado como arquiteto; e era cada
dia as Suas delícias, alegrando-me perante Ele em todo o tempo; folgando no seu
mundo habitável, e achando as minhas delícias com os filhos dos homens” (Provérbios
8:22-31).
“Quem
subiu ao céu e desceu? Quem encerrou os ventos nos seus punhos? Mas amarrou as
águas no seu manto? Quem estabeleceu todas as extremidades da terra? Qual é o Seu
nome, e qual é o nome de Seu filho? Certamente o sabes!” (Provérbios 30:4).
“A
sanguessuga tem duas filhas, a saber: Dá, Dá. Há três coisas que nunca se
fartam; sim, quatro que nunca dizem: Basta; o Seol, a madre estéril, a terra
que não se farta d’água, e o fogo que nunca diz: Basta” (Provérbios 30:15, 16).
“Há
três coisas que são maravilhosas demais para mim, sim, há quatro que não
conheço: o caminho da águia no ar, o caminho da cobra na penha, o caminho do
navio no meio do mar, e o caminho do homem com uma virgem” (Provérbios 30:18, 19).
“Quatro
coisas há na terra que são pequenas, entretanto são extremamente sábias; as
formigas são um povo sem força, todavia no verão preparam a sua comida; os
querogrilos são um povo débil, contudo fazem a sua casa nas rochas; os
gafanhotos não têm rei, contudo marcham todos enfileirados; a lagartixa
apanha-se com as mãos, contudo anda nos palácios dos reis. Há três que andam
com elegância, sim, quatro que se movem airosamente: o leão, que é o mais forte
entre os animais, e que não se desvia diante de ninguém; o galo emproado, o
bode, e o rei à frente do seu povo” (Provérbios 30:24-31).
“Eu
sou a rosa de Sarom, o lírio dos vales. Qual o lírio entre os espinhos, tal é a
minha amada entre as filhas. Qual a macieira entre as árvores do bosque, tal é
o meu amado entre os filhos; com grande gozo sentei-me à sua sombra; e o seu
fruto era doce ao meu paladar” (Cântico dos Cânticos 2:1-3).
“Pois
eis que já passou o inverno; a chuva cessou, e se foi; aparecem as flores na
terra; já chegou o tempo de cantarem as aves, e a voz da rola ouve-se em nossa
terra. A figueira começa a dar os seus primeiros figos; as vides estão em flor
e exalam o seu aroma. Levanta-te, amada minha, formosa minha, e vem” (Cântico
dos Cânticos 2:11-13).
“Desci
ao jardim das nogueiras, para ver os renovos do vale, para ver se floresciam as
vides e se as romanzeiras estavam em flor” (Cântico dos Cânticos 6:11).
Quando
aqui na Terra, frequentemente Cristo utilizava exemplos da natureza para
extrair lições espirituais. Mandava olhar às aves e aos lírios do campo para
compreender o cuidado de Deus (Mateus 6:26-30), apelava ao conhecimento das
árvores e seus frutos para se avaliar o caráter de uma pessoa ou ensino (Mateus
7:16-20). Suas parábolas estavam repletas de comparações da natureza para
ilustrar verdades espirituais: ovelhas, semeadura, colheita, vinha, o
crescimento da semente, os movimentos do vento, etc.
O
discurso de Paulo em Atenas foi eminentemente criacionista, afirmando que os
homens podem encontrar evidências de Deus nos próprios processos da vida humana,
que são maravilhosos:
“O
Deus que fez o mundo e tudo o que nele há, sendo ele Senhor do céu e da terra,
não habita em templos feitos por mãos de homens; nem tampouco é servido por
mãos humanas, como se necessitasse de alguma coisa; pois Ele mesmo é quem dá a
todos a vida, a respiração e todas as coisas [...] para que buscassem a Deus,
se porventura, tateando, O pudessem achar, o qual, todavia, não está longe de
cada um de nós; porque nEle vivemos, e nos movemos, e existimos; como também
alguns dos vossos poetas disseram: Pois dEle também somos geração” (Atos
17:24-27).
Em
Romanos, ele segue nessa linha afirmando que as coisas criadas ensinam sobre
Deus:
“Porquanto,
o que de Deus se pode conhecer, neles se manifesta, porque Deus lho manifestou.
Pois os Seus atributos invisíveis, o Seu eterno poder e divindade, são claramente
vistos desde a criação do mundo, sendo percebidos mediante as coisas criadas,
de modo que eles são inescusáveis” (Romanos 1:19, 20).
O
texto acima não diz meramente que a natureza aponta para o Criador, mas diz que
“os atributos invisíveis de Deus” podem ser “percebidos mediante as coisas
criadas”. Um exemplo disso é a descoberta do princípio da ação mínima pelo
matemático e filósofo francês Maupertuis. Ele extraiu seu princípio do estudo
da Bíblia e da utilização das regras matemáticas da natureza. Esse princípio
permite deduzir as leis físicas mais fundamentais.[*]
Considerando
que a natureza e a Bíblia são revelações do mesmo Criador, não deve haver
contradições entre elas, e o estudo da natureza não trará conhecimentos que
estejam em oposição às Escrituras.
Podemos
concluir, então, que a revelação escrita aponta para a revelação na natureza, e
a revelação na natureza aponta para Deus? Que ao evitar entender ou observar a
natureza estaremos perdendo importantes mensagens que Deus deixou escritas ali
para nós? Que a revelação de Deus tem duas pernas, e ao rejeitarmos uma
estaremos nos movendo com uma perna só?
( Graça Lütz é bióloga e bioquímica)
Referência:
[*] DE MAUPERTUIS, P. L. M.
Translation: Derivation of the laws of motion and equilibrium from a
metaphysical principle. https://en.m.wikisource.org/wiki/