A revista Ciência Hoje de julho publicou o interessante artigo “A árvore da vida”, escrito por Francisco Ângelo Coutinho, da Faculdade de Educação da UFMG; Rogério Parentoni Martins, do Departamento de Biologia da UFC; e Gabriel Menezes Viana, também da Faculdade de Educação da UFMG. Eles abrem o artigo assim: “O diagrama conhecido como ‘árvore da vida’ é uma representação gráfica da ascendência vertical de organismos a partir de uma suposta [isso mesmo, suposta] origem comum (raiz), contendo bifurcações (ramos) com extremidades que representam a diferenciação resultante do processo de especiação por meio da evolução. É uma figura poderosa, que organiza a forma pela qual compreendemos um dos aspectos importantes do processo evolutivo: o da formação de novas espécies. No entanto, pesquisas recentes lançam dúvidas sobre a adequação dessa imagem como a melhor representação para a dinâmica e a complexidade do processo evolutivo.”
Depois de traçar o histórico da figura/gráfico de Darwin, os autores explicam que “os estudos de Hennig e o aprimoramento, por outros biólogos, da sistemática filogenética levaram à consolidação da cladística, ramo da biologia que estuda o parentesco entre as espécies com base em suas [aqui também caberia um supostas] relações evolutivas. Com isso, a concepção da árvore da vida se modificou, e sua versão mais atual é representada pelos esquemas de clados (cladogramas) encontrados hoje nos livros didáticos de biologia”.
O artigo menciona também o legado de Ernst Mayr: “Nascido alemão e naturalizado norte-americano, o biólogo Ernst Mayr (1904-2005) exerceu forte influência sobre o desenvolvimento da filosofia da biologia moderna e proporcionou uma perspectiva particular sobre evolução e filogenia. Uma de suas grandes influências foi a formulação do ‘conceito biológico de espécie’: ‘espécies biológicas são grupos de populações real ou potencialmente intercruzantes que estão isoladas reprodutivamente de outros grupos semelhantes.’” [Leia também: “Biologia também é ciência histórica”.]
Ciência Hoje destaca o fato de que, para Mayr, a árvore da vida é uma árvore de espécies, representando um processo de herança vertical no qual não haveria troca de informações genéticas entre os “galhos”. Segundo o biólogo, “somente organismos sexualmente reprodutivos se qualificam como espécies”, criando o discutido conceito de paraespécies.
Os autores do texto realçam algo que os criacionistas dizem há muito tempo: parece haver intensa transferência lateral de genes entre bactérias e fungos, entre diferentes fungos e entre estes e outros organismo multicelulares. Há também hibridização, como fonte de variações limitadas que facilitam a adaptação a novos ambientes.
Transferência lateral tem que ver com informação já existente. Assim, a tal árvore da vida de Darwin, como os criacionistas sempre têm dito, estaria mais para “gramado da vida”, com a criação original dos tipos básicos de seres vivos (com seu amplo e versátil patrimônio genético) que sofreram limitadas diversificações de baixo nível. Assim, as espécies atuais seriam descendentes mais ou menos modificados das espécies originais.
Embora critiquem a validade do diagrama de Darwin, como não poderiam deixar de fazer, os autores do texto tentam, no último parágrafo, amenizar as coisas para o naturalista: “É importante, entretanto, lembrarmos da advertência do biólogo norte-americano Edward O. Wiley: ‘A hipótese da árvore, como todas as hipóteses científicas, é apenas conjectura e não fato.” Admitir isso e usar as palavras “hipótese” e “conjectura” já é um bom começo...
O blog Desafiando a Nomenklatura Científica também comentou o assunto: “À medida que os evolucionistas elaboraram mais sobre a ideia de Darwin no século 20, o conceito de uma árvore evolucionária se tornou cada vez mais fundamental para a teoria. Esta figura abaixo, de um livro-texto importante [George Johnson, Jonathan Losos, The Living World, Fifth Edition, McGraw Hill, 2008.] é típica:
“Como é explicado no livro didático: ‘Hoje os cientistas podem decifrar cada um dos milhares de genes (o genoma) de um organismo. Ao compararem os genomas de organismos diferentes, os pesquisadores podem, literalmente, reconstruir a árvore da vida. Os organismos na base da árvore são as formas mais antigas de vida, tendo evoluído bem antes na história da vida na Terra. Os galhos superiores indicam outros organismos que evoluíram mais tarde.’ [...]
“E à medida que mais dados de genomas se tornaram cada vez mais disponíveis os evolucionistas pensaram naturalmente que seria possível deduzir uma árvore evolucionária completa. [...]
“[Mas a coisa não é tão simples.] Como um evolucionista escreveu: ‘Incongruências filogenéticas podem ser vistas em toda a árvore universal, desde a sua raiz até às principais ramificações dentro e entre os variados táxons até à elaboração dos próprios agrupamentos primários.’
“Outro artigo admite que ‘quanto mais os dados moleculares são analisados, mais difícil é interpretar exatamente as histórias evolucionárias daquelas moléculas.’ Ou, ainda, como outro evolucionista propôs sucintamente, ‘a vida não é uma árvore’.”
E os livros didáticos, continuarão falando da tal árvore?[MB]
Leia também: “Por que é necessária uma nova teoria da evolução” e “‘Árvore da Vida’ de Darwin sofre ataque na base”