O celibato como regra obrigatória para os padres não nasceu com o cristianismo. Foi uma prática cultural construída gradualmente e só se tornou compulsória para o clero latino, no século XII, entre conflitos e discursos contraditórios. A aceitação de uma norma social ocorre em um processo lento, marcado por resistências, para finalmente se tornar um hábito ou habitus, como uma regra introjetada pelos indivíduos que formam a sociedade. [...]
Os homens e as mulheres que se abstinham de práticas sexuais concebiam a castidade como símbolo do apogeu da natureza humana, liberta da "animalidade e da imundície" que impossibilitavam o contato do homem com a divindade e o restabelecimento da perfeição perdida: “Eunucos voluntários pelo Reino dos Céus” (Mateus, 19:12). O ato sexual seria uma fraqueza da carne, inerente à humanidade, que devia ser controlada pelo matrimônio. [...]
Um dos critérios para punir os comportamentos desviantes dos sacerdotes residentes no Brasil colonial era o grau de publicidade do crime e dependia das denúncias efetuadas para que o clérigo fosse julgado e talvez condenado, ou seja, a tolerância ou a intolerância com os relacionamentos clericais variava de acordo com a situação. Por vezes a sociedade "aceitava" os concubinatos de clérigos, mas também os delatava na presença intimidadora da Igreja.
(Trechos do livro Entre a Batina e a Aliança, de Edlene Silva)