quarta-feira, outubro 27, 2010

Crise na Física e na Biologia?

Em 27 de abril de 1900, na Royal Institution of Great Britain, o matemático e físico escocês William Thomson, Lorde Kelvin de Lars (1824-1907), fez um discurso que se tornou conhecido e resumido pelos historiadores da ciência nos seguintes termos: “Vejo apenas duas pequenas ‘nuvens’ no sereno céu do conhecimento científico: o experimento de Michelson-Morley, realizado em 1887, e a discordância entre os valores medidos e os valores teóricos previstos pela termodinâmica para os calores específicos em baixas temperaturas.” O discurso foi reproduzido pela Philosophical Magazine – Revista Brasileira de Ensino de Física, com o título de “Duas nuvens ainda fazem sombra na reputação de Lorde Kelvin”. Em dois trabalhos que publiquei, escrevi que essas “duas pequenas nuvens” transformaram-se em duas violentas tempestades: (1) A Teoria da Relatividade Restrita de Einstein (1905) e (2) a Teoria Quântica de Planck (1900). Ainda nesses trabalhos, considerei a existência de “outras nuvens” no “sereno céu” da física do final do século 20 que poderão desencadear novas tempestades agora. Uma delas está “ligada à cosmologia, relacionada com a existência da matéria e da energia escuras”. Vejamos a razão disso.

Em 30 de junho de 2001, a Nasa lançou o satélite Wilkinson Microwave Anisotropy Probe (WMAP) com o objetivo de examinar algumas anomalias na radiação cósmica de fundo de micro-onda (RCFM), detectada em 1965, indicando o resquício da “grande explosão” (Big Bang) observada pelo satélite Cosmic Background Explorer (Cobe), lançado em novembro de 1989. Com o término da missão do WMAP, em setembro de 2003, iniciaram-se as análises dos dados que ele enviou. Em março de 2006, a equipe desse satélite anunciou que o nosso Universo tem a idade aproximada de 13,7 bilhões de anos e é composto de 23% de matéria escura, 73% de energia escura e 4% de matéria bariônica, a matéria convencional.

As análises indicaram ainda que a velocidade de expansão do Universo é de 21,8 km/s, por milhão de anos-luz, e que a densidade de sua massa crítica vale Ω = 1,024, o que significa que a geometria do Universo é quase euclidiana (plana). Esses dados, no entanto, não são explicados pelo Modelo Padrão Cosmológico do Big Bang (MPCBB). Esse modelo foi proposto nos anos 40 e desenvolvido entre 1970 e 2000, supondo que o Universo começou com a “explosão” de uma singularidade.

Assim, creio que a não explicação (até agosto passado) de aproximadamente 96% de material cosmológico (matéria e energia) represente uma crise na cosmologia. Em contraposição, a não descoberta do bóson de Higgs (bH), (previsto em 1964), peça fundamental do Modelo Padrão da Teoria das Partículas Elementares (MPTPE) também ampliará a crise da cosmologia, pois é o bH que explica a origem das massas das partículas elementares, sendo estas os componentes da matéria convencional cosmológica observada.

A crise na física referida anteriormente, no meu entendimento, está associada a uma outra, agora na biologia, particularmente na genética. Vejamos como. A Teoria da Evolução formulada por Charles Robert Darwin (1809-1882) e Alfred Russel Wallace (1823-1913), exposta em 1859, tem como característica básica a evolução do homem em quatro grandes momentos: Homo erectus, Homo habilis, Homo sapiens e Homo sapiens sapiens. Além disso, existe muita controvérsia sobre a evolução do homem a partir dos macacos (principalmente de gorilas e chimpanzés). Mas a grande questão é saber por que o homem é dotado de consciência e os macacos não, considerando que o homem e os chimpanzés e gorilas têm aproximadamente 98% de genes idênticos [é bom que se diga que até nisso há controvérsias]. A crise na biologia, por intermédio da genética, é explicar se existe algum gene responsável pela consciência humana.

Os genes são segmentos do composto orgânico chamado DNA, molécula armazenadora de instruções que coordenam o desenvolvimento e o funcionamento de todos os seres vivos. A história dessa molécula começa, em 1869, quando o médico suíço Johann Friedrich Miescher (1844-1895) descobriu uma nova substância localizada no núcleo das células, denominada por ele de nucleína. Em 1889, o patologista alemão Richard Altmann (1852-1900) sugeriu que essa nova substância se chamasse ácido nucleico. Depois de vários estudos sobre os ácidos nucleicos, a estrutura molecular em dupla hélice do DNA foi finalmente descoberta, em 1953, pelos biólogos moleculares James Dewey Watson, americano, e Francis Harry Compton Crick, inglês.

(José Maria Filardo Bassalo, Scientific American Brasil)

Nota: É o tipo de artigo que mostra o quanto de humildade temos que ter para admitir o quanto ainda não sabemos. Aliás, se nosso cérebro é tão somente resultado de evolução animal – portanto, um amontoado de moléculas acidentalmente organizadas –, nada garante que realmente saberemos interpretar a realidade que nos cerca, ou que nossa interpretação corresponderá à realidade objetiva. Afinal, como um acidente (cérebro) poderá entender outro acidente (Universo)?[MB]