segunda-feira, maio 09, 2011

Odeio prepotência

O texto a seguir foi publicado na quinta-feira no Facebook de Paloma Jorge Amado e reproduzido no blog de Cláudia Wasilewski:

“Era 1998, estávamos em Paris, papai já bem doente participara da Feira do Livro de Paris e recebera o doutoramento na Sorbonne, o que o deixou muito feliz. De repente, uma imensa crise de saúde se abateu sobre ele, foram muitas noites sem dormir, só mamãe e eu com ele. Uma pequena melhora e fomos tomar o avião da Varig (que saudades) para Salvador.

“Mamãe juntou tudo que mais gostavam no apartamento onde não mais voltaria e colocou em malas. Empurrando a cadeira de rodas de papai, ela o levou para uma sala reservada. E eu, com dois carrinhos, somando mais de 10 malas, entrava na fila da primeira classe. Em seguida chegou um casal que eu logo reconheci, era um politico do Sul (não lembro se na época era senador ou governador, já foi tantas vezes os dois, que fica difícil lembrar). A mulher parecia uma arvore de Natal, cheia de saltos, cordões de ouros e berloques (Calá, com sua graça, diria: o jegue da festa do Bonfim). É claro que eu estava de jeans e tênis, absolutamente exausta. De repente, a senhora bate no meu ombro e diz: ‘Moça, esta fila é da primeira classe, a de turistas é aquela ao fundo.’ Me armei de paciência e respondi: ‘Sim, senhora, eu sei.’ Queria ter dito que eu pagara minha passagem enquanto a dela o povo pagara, mas não disse. Ficou por isso. De repente, o senhor disse à mulher, bem alto para que eu escutasse: ‘Até parece que vai de mudança, como os retirantes nordestinos.’ Eu só sorri. Terminei o check in e fui encontrar meus pais.

“Pouco depois bateram à porta, era o casal querendo cumprimentar o escritor. Não mandei a p[...], apesar de desejar fazê-lo, educadamente disse não. Hoje, quando vi na TV o Senador dizendo que foi agredido por um repórter, por isso tomou seu gravador, apagou seu chip, eteceteraetal, fiquei muito retada, me deu uma crise de mariasampaísmo e resolvi contar este triste episódio pelo qual passei. Só eu e o gerente da Varig fomos testemunhas desse episódio, meus pais nunca souberam de nada…”

(Paloma Jorge Amado é psicóloga, republicado por Augusto Nunes no site da Veja)