Atores do filme Uma Linda Mulher |
Hoje
eu quero falar sobre a construção social da masculinidade, especificamente da
construção social do cliente. Vamos partir do princípio de que
homens não “são assim mesmo”. Na verdade, são socializados para serem
clientes, estupradores, agressores de mulheres e cafetões. Mas o que temos que
entender e nos perguntar é: De onde vem isso? O que faz um homem
chegar ao ponto de pagar por sexo com uma mulher que ele nunca viu na vida? Uma
mulher que ele sabe muito bem que prefere estar em qualquer lugar do que ali e
que provavelmente está nessa situação por ter sido abusada sexualmente, por ser
pobre e estar desesperada. Um dos fatores – não o único – mas um fator-chave
que leva os homens a procurarem prostitutas é a pornografia. A pornografia é a
principal fonte de “educação sexual” nos dias de hoje; não há nada mais
poderoso como educação sexual do que ela, e vou falar de como a
pornografia, a mídia e a cultura pop
criam os clientes. Mas como a mídia e a cultura pop fazem isso? Glamourizando a prostituição e ignorando,
polindo e reabilitando clientes. Vamos começar lembrando do filme Uma Linda Mulher.
Pense
na história: um cliente que se apaixona pela prostituta e eles vivem felizes
para sempre. Todos concordam que foi um sucesso, não? Faturou milhões. Bilhões,
provavelmente. E o que Hollywood faz sempre que um filme fatura milhões? Faz de
novo, faz a parte 2. Minha pergunta é: Cadê Uma
Linda Mulher 2? Vamos imaginar como seria: eles fazem um lindo
casamento entre a prostituta e o cliente e eles vão viver em uma linda
casa. E um dia eles brigam, e então do que ele vai xingá-la? “Sua p...!”
“Sua
p... imunda!” “Não discuta comigo porque, senão, adivinha, te jogo de volta na
rua de onde você veio!” Me responda uma coisa: Quantas prostitutas você acha
que vivem felizes para sempre com seus clientes? Está vendo por que eles não
podiam fazer Uma Linda Mulher 2?
Mulheres
foram assistir a isso, não foram? E todo mundo amou, certo? Esse é um sinal de
quanto as mulheres estão colonizadas, de como o patriarcado está nas nossas
mentes e molda quem somos.
Outra
pergunta: Que ator estrela de Hollywood bateu tanto em uma mulher que ela
acabou no hospital e o processou? Saiu em todos os jornais britânicos, mas nos
EUA nem uma palavra: Jack Nicholson.[1] Se você não acredita em mim, existe
um laudo que está no processo feito pela prostituta. E o laudo diz como
ele bateu e jogou ela de cabeça no chão porque não queria pagar pelo programa
depois de ter feito sexo com ela e outra mulher. Viu como a mídia colabora com
o silêncio para manter isso invisível? E naquele mesmo ano, depois disso ter
acontecido, ele estava na primeira fila do Oscar e ninguém tocou no
assunto.
Conhece
Eliot Spitzer, o cliente mais famoso dos Estados Unidos?[2] Sabe o que ele era
antes de ser desmascarado como um cliente? Governador de Nova York. Antes de
ser pego gastando 10.000 dólares por mês com prostitutas, sabe o que ele estava
prestes a lançar? Uma campanha anti-prostituição. Ele era tão violento como
cliente que era difícil achar prostitutas que aceitassem sair com ele. Ainda
descobriram que ele traficava mulheres de um estado para outro. Ele foi
“reabilitado” e agora tem um programa de TV. E sua esposa o apoia.
Mas
o que leva homens como Charlie Sheen, Tiger Woods, Eliot Spitzer, Hugh Grant,
Jerry Springer e Eddie Murphy a se tornarem clientes? Vamos analisar uma das
forças sociais que constroem a masculinidade: a pornografia.
1.
É a legitimação cultural da compra e venda de mulheres.
2.
É a prostituição filmada: mulheres sendo pagas para fazer sexo. A diferença
entre prostituição e pornografia é que você pode continuar vendendo a mulher
quantas vezes quiser, mesmo depois de morta você pode vender sua imagem várias
e várias vezes. Não existe limitação física das mulheres na pornografia, pois o
sexo prostituído está gravado.
3.
É a representação visual do sexo prostituído.
4.
É o uso de mulheres traficadas sexualmente.
5.
É criadora de demanda.
Vou
explicar como ela cria a demanda explicando como a indústria pornográfica
funciona. Sempre que falo sobre pornografia, me dizem que ela sempre existiu, e
eu concordo com isso. Desde o início dos tempos, sempre existiu pornografia. Mas
o que eu quero falar é sobre a indústria pornográfica.
A industrialização do sexo
É
necessário conhecer e entender a indústria pornográfica para mudar a visão que
temos sobre o assunto. A indústria pornográfica começou em 1953 com a primeira
edição da Playboy. Nunca antes na
história uma revista pornográfica tinha circulado pelo mainstream do capitalismo. É por isso que temos que pensar nisso
como uma indústria. Temos que analisar como um plano de negócios de um pequeno
grupo de administradores de empresas pensando em como criar demanda e construir
mercado.
É
difícil ter estatísticas exatas, mas é uma indústria que movimenta
aproximadamente 97 bilhões de dólares no mundo todo. E lembre-se de que 97
bilhões de dólares compram muitos políticos na América. O montante de dinheiro
que os pornógrafos investiram para o desenvolvimento da internet foi crucial
para a sua criação. A internet não comanda a pornografia, a pornografia
comanda a internet:
-
37% da internet é pornografia.
-
Existem mais de 26 milhões de sites pornôs.
-
A indústria pornográfica fatura 3.000 dólares por segundo.
-
40 milhões de usuários consomem pornografia regularmente nos EUA.
-
Uma a cada quatro buscas do Google são por pornografia.
-
Mais de um terço de todos os downloads
feitos são pornografia.
-
A cada ano são lançados mais de 13.000 filmes pornôs.
Numa
conferência recente, os pornógrafos anunciaram que estão investindo em
desenvolvimento de celulares, pois em países em desenvolvimento muitas famílias
têm apenas um computador em casa e os homens não conseguem baixar pornografia
no meio da sala. Já com um celular, os homens podem achar um lugar sozinhos
para assistir pornografia. E onde a pornografia chega, o tráfico de
mulheres e a prostituição vão atrás.
Esse
é o nível de pesquisa que eles fazem para entrar em países superpopulosos. “A
‘corporatização’ da pornografia não é algo que acontece ou que vai acontecer, é
algo que já aconteceu – e se você ainda não se ligou nesse fato, não há mais
lugar nessa mesa para você. É Las Vegas acontecendo de novo: os independentes,
mafiosos renegados e empreendedores visionários sendo varridos pelas grandes
corporações” (Adult Video News, 2009).
Pornografia
não é um amontoado de imagens aleatórias, não é fantasia – fantasia
acontece na cabeça, pornografia acontece nos bancos internacionais do
capitalismo. Dois lugares completamente diferentes. O que significa fazer
parte da indústria pornográfica hoje:
-
Aumentar o capital.
-
Contratar gerentes e contadores.
-
Fazer fusões e aquisições.
-
Fazer exposições comerciais.
-
Fazer negócios com outras empresas (bancos, empresas de cartão de crédito,
operadoras de TV a cabo, etc.).
Cada
vez que um homem compra pornografia, isso vai para um cartão de crédito. Agora
imagine quanto dinheiro as empresas de cartão de crédito ganham com isso. Agora
pense nas conexões entre a mídia mainstream
e a pornografia. Um exemplo de como essa conexão funciona são as
RealDolls, mulheres de silicone “anatomicamente corretas”, cuja lista de espera
para comprar é de seis meses. Todos os anos em Las Vegas acontece uma convenção
pornô. Eu fui lá e entrevistei o cara que estava no estande da RealDolls e
perguntei: “Por que você acha que os homens compram essas bonecas?” Ele me
olhou direto nos olhos e disse: “Isso os ajuda a desenvolver relacionamentos
com mulheres.” Ok. Então perguntei: “Você já assistiu ao filme A Garota Ideal (Lars and the real girl)? Sabe, o filme em que um cara se
apaixona por uma boneca? Estrelando Ryan Gosling, uma grande estrela de
Hollywood.” Ele me respondeu: “Se eu já assisti? Nós fomos os consultores
do filme e no dia do lançamento nosso site caiu de tanto que os homens
acessaram.”
Quando
lidamos com a indústria pornográfica, estamos lidando com um poder
cultural, social e político que tem a capacidade de definir o panorama
sexual, pois trabalha como qualquer outra indústria. Concordamos que a
indústria de alimentos molda a maneira como comemos, que a indústria da moda
molda a maneira como nos vestimos, então como é possível que a indústria do
sexo seja a única que não molda o comportamento humano? Se a indústria
pornográfica não molda a maneira como nos comportamos, então tudo que sabemos
sobre sociologia e psicologia está errado. Teríamos que concordar que todos nós
nascemos com certa sexualidade e que ela se mantém intocada pela cultura, e
sabemos que isso é impossível; sabemos que a sexualidade é construída pela
cultura.
Quando
falo em pornografia, que imagens vêm a sua cabeça? Revista Playboy? Pessoas fazendo sexo? A revista Playboy está falida e só sobrevive porque vende sua marca e
investe em outras empresas mais hardcore
sob outros nomes para manter sua marca “limpa”. A Penthhouse faliu e a Hustler
se diversificou. [...]
É
assim que a pornografia é hoje: não existe mais soft-porn (pornô leve) e hardcore
(pornô pesado), o que existe é feature-porn
(pornô “longa metragem”) e gonzo-porn
(pornô “sem roteiros”). O soft-core
não existe mais porque migrou para a cultura pop. O nível de hipersexualização das artistas pop atuais seria considerado soft-porn
15 anos atrás. Hoje olhamos para a mídia e ficamos dessensibilizados a um nível
de hipersexualização que é totalmente novo. E por causa dessa hipersexualização
da cultura pop a pornografia teve que
ficar mais hardcore para se
diferenciar da MTV, por exemplo.
Para
a indústria, o feature-porn é o que
eles chamam de “mercado para casais”. É um filme de uma hora e meia, música
suave, às vezes tem história, mas o sexo é hardcore. Os homens costumam mostrar esses filmes para as
namoradas para elas se acostumarem com sexo hardcore.
No
documentário The price of pleasure (O
preço do prazer), por exemplo, um rapaz fala sobre como ele quer apresentar
sexo anal para sua namorada, mas não sabe como fazer. Então ele pega um filme feature-porn, que sempre tem sexo anal,
e espera o momento certo para propor sexo anal a ela: o momento em que ela
não fizer mais careta para as cenas. Ou seja, quando um homem sugere assistir
um feature-porn com uma mulher,
geralmente ele quer que ela se anime a fazer sexo hardcore com ele. Resumindo, é esse tipo de pornô que homens e
mulheres costumam assistir juntos. Mas quando homens estão sozinhos, o que eles
assistem mesmo é gonzo-porn (pornô “sem
roteiros”): é assim que eles chamam o pornô pesado sem história nenhuma. O
“pai” desse tipo de pornô é um homem chamado Max Hardcore. [...] Ele é um
sádico sexual e um dos donos da indústria gonzo. Ele, na verdade, inventou
a pornografia com vômito. Esse homem usa espéculos como instrumento de tortura
em vaginas e ânus de mulheres.
Quando
comecei minhas pesquisas 15 anos atrás e entrevistei pornógrafos da indústria,
nenhum deles queria chegar perto do Max Hardcore; ninguém queria ser dono dessa
empresa; ele era considerado muito extremo. Da última vez que estive em
Las Vegas, ele tinha o maior estande no centro da convenção pornô e tinha a maior
fila de autógrafos lá. Ele agora é o centro da indústria
pornográfica.
Não
existe um jeito melhor de contar a história da pornografia do que contar a
história da marginalização de Max Hardcore até sua chegada ao topo. [...] Você
não pode deixar que o cara que vai se masturbar assistindo aquele sexo violento
veja qualquer sinal de humanidade naquelas mulheres; porque na maioria das
vezes os homens que chegam até esses filmes pornôs não são sádicos. Mas a
questão é como fazer homens que não são sádicos sexuais se masturbarem vendo
sexo sádico? Isso é um problema na indústria, porque você concorda que a
maioria dos meninos de 13 anos não é sádico sexual ainda, não é mesmo?
Isso
é muito importante. Porque quando você faz tráfico de mulheres, você tem
que mostrar que aquelas mulheres “são diferentes das que você conhece”. Você
faz essa divisão porque, quando chega a hora de assistir tortura sexual, ninguém
vai olhar nos olhos daquela mulher e ver um ser humano, mas sim uma p.... Homens
com frequência discutem comigo dizendo que as mulheres que fazem esse tipo de
filme amam o que estão fazendo, e eu sempre rebato: “Você já pesquisou?
Conversou com as atrizes?” E eles respondem: “Dá para ver que elas gostam.” E o
mais interessante é que, na verdade, você vê o contrário. Elas são péssimas
atrizes. Podemos ver que elas estão chorando, que elas estão chateadas e que,
no final, elas estão completamente acabadas. [...]
Agora
imagine um menino de 11 anos, hormônios aflorando, ele digita “pornô” no Google
imaginando que vai ver alguns seios e é isso que ele encontra. Como eles o mantêm
no site? Os pornógrafos pensaram nisso muito bem: “Sabe o que a gente diz sobre
romance e preliminares? A gente diz [...]! Esse site não é para meias-bombas
tentando impressionar vadias metidas. A gente pega lindas p... e faz o que todo
homem realmente gostaria de fazer. A
gente faz elas engasgarem até a maquiagem borrar e... [impublicável]” (texto de
um site pornográfico).
Imagine
um menino de 12 anos, ele não sabe que vai assistir isso e se assusta, mas os
pornógrafos planejaram isso muito bem, eles dizem: “Faça o que todo homem realmente gostaria de fazer.” Essa
é a isca. Eles estão dizendo para o menino: “Você é um homem de verdade? Porque
se você for, é isso que você realmente gostaria de fazer.” E o que você acha
que um menino de 12 anos vai fazer? Vai fugir assustado porque não é um “homem
de verdade”? Claro que não! Ele está construindo sua masculinidade. E como você
a constrói? Você vaga pela cultura se perguntando o que significa ser um
homem. É assim que eles conquistam os meninos. Assim como as mulheres
vagam pela cultura se perguntando “O que significa ser uma mulher?”, e
encontram Beyoncé, Lady Gaga e Rihanna, eles vagam pela cultura e encontram isso. É como uma aranha espalhando a
teia.
Os
meninos acabam excitados e traumatizados. Essas crianças são vítimas da
indústria pornográfica porque fazer isso com um menino de 12 anos é vitimá-lo e
traumatizá-lo, pois não é isso que ele procura. Essa é a idade em que ele
desenvolve suas preferências sexuais, e quanto mais ele desenvolve suas
preferências sexuais pela pornografia, mais a pornografia define quem ele é. Quanto
mais a pornografia define quem ele é, mais provavelmente ele vai se tornar um
cliente. Porque quantas mulheres ele vai encontrar que vão fazer esse tipo
de coisa? Ele vai querer fazer essas coisas. E é assim que a pornografia cria
demanda. [...] Ninguém precisa ser PhD para entender o que isso
significa: nojo e ódio às mulheres numa idade em que os
meninos estão desenvolvendo suas preferências sexuais. [...]
Você
tem noção de que um pequeno grupo de homens em Los Angeles está construindo a
preferência sexual dos meninos pré-adolescentes no mundo todo? Isso é o que eu
chamo de colonização cultural na sua pior forma. Porque quando você coloniza sexualmente
uma cultura, você a coloniza por completo.
Um
relatório médico da indústria pornográfica mostrou que atualmente as
atrizes estão contraindo gonorreia na garganta e nos olhos e clamídia no ânus.
Você acha justo que a cada ano um grupo de mulheres de cada geração tenha que
lidar com isso? Você acha que elas são diferentes de mim e de você?
Antigamente,
o que os meninos adolescentes faziam quando os hormônios começavam a agir?
Roubavam a Playboy do pai. Você tinha
acesso limitado à pornografia. Por pior que a Playboy fosse, ela não chegava aos pés do que a pornografia é
hoje. Nunca antes uma geração de meninos foi criada com acesso 24 horas à
pornografia pesada. Esse tipo de experimento social nunca foi feito antes. E
esses meninos vão crescer e se tornar políticos, advogados, médicos, ou seja,
os líderes da próxima geração, pois quando eles crescerem ainda viveremos numa
sociedade patriarcal. E eu pergunto: Que tipo de pais, advogados, juízes vão se
tornar esses homens criados pela pornografia gonzo? Esse tipo de pergunta não
está sendo feita. E como socióloga e estudiosa de pornografia, posso garantir
que haverá implicações que você ainda nem pode entender. Porque assim que você
perde a habilidade de se conectar emocionalmente com alguém, que tipo de ser
humano você se torna?
E
qual é o futuro da pornografia? Bom, a pornografia está num beco sem saída.
Sabe por quê? O problema que eles enfrentam hoje é o seguinte: eles
já fizeram tudo o que podiam com o corpo de uma mulher, até quase matá-la. Não
sobrou mais nada. E porque a pornografia é tão rentável, acessível e anônima, e
porque tantos homens a usam todos os dias, se instaurou uma total
dessensibilização. O que faz o sexo ser interessante? A pessoa com a qual você
está fazendo sexo e a conexão que tem com ela. Mas a pornografia destruiu
toda essa conexão e deu lugar ao nojo e ao puro ódio às mulheres.
Veja
o que disse um diretor de filmes gonzo: “O problema com o mercado de sexo
extremo, o sexo gonzo, é que tantos fãs querem ver coisas cada vez mais
extremas que estamos sempre procurando novos caminhos para fazer coisas
diferentes.” Bom, e sabe para onde a indústria pornográfica está indo?
Em
2003, a lei que proibia pornografia com mulheres de 18 anos que
aparentavam ter menos de 18 anos foi derrubada. Do dia para a noite,
houve uma explosão do que eu chamo de “pornografia infantil
legalizada”. Estão na sessão “teen”
dos sites pornográficos. O tipo de filme que temos hoje em dia é: Primeira vez com o papai, P... do papai, Tudo bem, ela é minha enteada 7. Você sabe quantas enteadas são
estupradas? Isso não é coincidência. Pedófilos costumam ir atrás de mulheres
com filhos. E aonde tudo isso está nos levando?
Um
tempo atrás entrevistei estupradores de crianças que não eram pedófilos. Explico:
nenhum deles se encaixava na descrição do que é um pedófilo – homens que
em média aos 14 anos começam a molestar crianças e quando chegam à fase adulta
deixam um rastro de centenas de vítimas. Esses homens que entrevistei estavam
presos por posse de pornografia infantil e por estuprar uma criança depois dos
50 anos, e quando eu perguntei se eles eram pedófilos, eles ficaram ofendidos e
disseram: “Claro que não! A gente prefere sexo com mulheres adultas!”
Então eu perguntei: “Mas se vocês não são pedófilos, por que
estupraram crianças?” E a resposta que eles me deram foi: “Ficamos
entediados com a pornografia adulta e queríamos tentar algo novo.” E sabe
quanto tempo eles levaram para estuprar uma criança depois de ver pornografia
infantil? Um ano.
É
isto o que a sociedade fez: abriu as portas para uma nova geração de homens
que nunca antes havia considerado uma criança como vítima, e agora
considera.
Você
conhece o termo aliciamento, não? Aliciamento é quando
um molestador foca numa vítima criança, mas ele não bate ou violenta, ele
diz o quanto ela é especial, o quanto ela é legal, ele compra presentes, ele
diz o quanto ela é gostosa até que chega um ponto em que a criança acredita que
a coisa mais importante na vida dela é o quanto ela é atraente.
Nesse
dia das entrevistas, eu aprendi uma lição valiosa sobre a nossa cultura, e ela
não me foi dada por um acadêmico, mas por um estuprador que estava preso por
violentar a enteada de 10 anos. Vou chamá-lo de Dick. Quando entrevistei
Dick e perguntei como ele estuprou a criança, ele disse: “A cultura fez boa
parte do aliciamento por mim.” Foi aí que a minha ficha caiu. Vivemos numa
sociedade aliciadora. Não existe mais um único aliciador aliciando uma
única criança de cada vez; o que existe é uma cultura inteira aliciando
nossas meninas a se comportarem inapropriadamente de maneira sexual e
aliciando nossos meninos a serem fãs de pornografia gonzo. Nossa cultura
se tornou um aliciamento coletivo.
(Gail Dines, FestivalMarginal)
Leia também: “A ilusão da pornografia” e “Inocência comprometida”