Karl
Marx sempre disse que a religião é o ópio do povo, mas sua afirmação era
baseada na política, não em fatos científicos. Porém, um estudo divulgado pela
Universidade de Washington sugere que participar de cultos em megaigrejas pode
desencadear sentimentos de transcendência e gerar mudanças na química do
cérebro. Esse sentimento de “euforia”
espiritual faz os fieis voltarem para receber mais. “Nós vemos essa
experiência de pura alegria ser comum nas megaigrejas. Por isso digo que é como
uma droga”, explica James Wellman, professor de religião e co-autor do estudo. O
estudo “God is like a drug: Explaining Interaction Ritual Chains in American
Megachurches” [Deus é como uma droga: Explicando cadeias de interação ritual
em megaigrejas] foi apresentado na reunião anual da Associação Americana de
Sociologia, em Denver. Além de Wellman, Katie E. Corcoran e Kate
Stockly-Meyerdirk, estudantes da pós-graduação em sociologia e religião
comparada na Universidade de Washington estiveram envolvidos na pesquisa com dados
coletados desde 2008.
Grandes
reuniões de experiências compartilhadas, como shows e eventos esportivos, também desencadeiam sentimentos de euforia, disse a doutoranda Katie
Corcoran, co-autora da pesquisa. Segundo ela, “as igrejas parecem ser algo
único, onde esses sentimentos não são apenas experimentados como euforia, mas
sim como algo transcendente ou divino”.
Os
autores teorizam que esse sentimento de “chapação”
espiritual é interpretado pelo cérebro como um “coquetel de oxitocina”.
Essa experiência transcendente libera a oxitocina, uma substância química
que estimula a interação social. Já ficou comprovado que emoção e experiências
em grupo aumentam os níveis de oxitocina.
Muitos
participantes usaram a palavra “contagioso” para descrever o sentimento de
participar de um desses cultos, onde os membros chegam com fome de experiências e acreditam sair do ambiente “energizados”. Um dos fieis
entrevistados relata que “o amor de Deus se torna [...] uma droga que você
não pode esperar para vir buscar depois. [...] Você não pode esperar para
receber essa ‘dose’ que vem de Deus.” Outro disse: “Você pode olhar para cima e
ver o Espírito Santo passar por cima da multidão como uma ‘ola’ em um jogo
de futebol”, relata Corcoran.
As
megaigrejas conseguem gerar esse estimulo elevado por causa de seu estilo
de culto. Os pesquisadores acreditam que elas usam tecnologia e apelos emocionais para criar uma
experiência compartilhada por congregações com milhares de pessoas em cada
culto. “A música moderna com letras
otimistas, câmeras que mostram no telão uma audiência sempre
sorridente, dançando, cantando ou
chorando, além de um líder extremamente carismático cujos sermões deixam as pessoas sensíveis ao
toque do ponto de vista emocional [...] servem para criar essas fortes
experiências emocionais positivas”, resume a doutoranda.
O
pastor [é] um “gerador de energia”, que se comunica com a congregação
através de um sermão fácil, informal e
emocional. Ao invés de ser analítico ou teológico, suas mensagens querem
que as pessoas presentes apenas “sintam-se bem” ou “compreendam tudo”,
ressalta Wellman.
Essa
mensagem reconfortante também é uma das chaves para o sucesso das megaigrejas.
Afinal, “como você pode atrair tanta gente? Você oferece uma forma genérica de cristianismo que é
otimista, emocionante e inspiradora”, diz Wellman, que acrescenta: “Isso
não é como os avivamentos antigos. É uma forma nova e híbrida de cristianismo,
que é mutante e separada de todas as instituições tradicionais com as quais o
cristianismo sempre se identificou.” [...]
Nota:
Se o culto provoca apenas euforia, amortece a razão e leva ao êxtase, fenômeno
típico de igrejas pentecostais e neopentecostais. Nesse caso, por mais sincero
que seja o adorador, ele deve se questionar se seu desejo de ir ao culto (e
nessas igrejas há cultos praticamente todos dias, geralmente com “casa cheia”)
tem que ver com a vontade de encontrar Deus, louvá-Lo e ouvir Sua Palavra ou se
essa motivação está mais para satisfação de um desejo emocional, um “vício”. O
verdadeiro culto, segundo o apóstolo Paulo, deve ser racional (Rm 12:1) e tudo
o que se faz para Deus deve ser feito com decência e ordem (1Co 14:40). No
culto, o adorador deve ser elevado à atmosfera do Céu, deve sentir contrição e
desejo de renovação espiritual. Como resultado do perdão e da aceitação de
Deus, o adorador manifesta um louvor alegre, porém reverente, pois sabe que
está na presença do Criador do Universo. Isso é culto, o resto é show dopamínico.[MB]