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“É
mole? Vou ao médico tratar da depressão e ele me manda rezar!” A recomendação
que gerou surpresa na médica e professora universitária Maria Inês Gomes, 67,
agora tem aval da Associação Mundial de Psiquiatria. No mês passado, a entidade
aprovou documento declarando a importância de se incluir a espiritualidade no
ensino, pesquisa e prática clínica da psiquiatria. A Sociedade Brasileira de
Psiquiatria (SBP) ainda não se posicionou sobre o assunto. A proposta,
obviamente, não é “receitar” uma crença religiosa ao paciente, mas conversar
sobre o assunto. O indexador de estudos científicos PubMed, do governo
americano, lista mais de mil estudos sobre o tema. Os recursos espirituais
avaliados nesses trabalhos variam bastante, desde acreditar em Deus ou um poder
superior, frequentar alguma instituição religiosa ou mesmo participar de
programas de meditação e de perdão espiritual, mas a grande maioria conclui que
há correlação entre espiritualidade e bem-estar.
O
maior impacto positivo do envolvimento religioso na saúde mental é entre
pessoas sob estresse ou em situações de fragilidade, como idosos, pessoas com
deficiências e doenças clínicas. Não se trata, claro, da prova científica da
ação de Deus – uma hipótese dos pesquisadores é que a religiosidade sirva, por
exemplo, para reforçar laços sociais, reduzindo a incidência de solidão e
depressão e amenizando o estresse causado por doenças ou perdas.
Três
meta-análises (revisões científicas) já realizadas sobre o tema indicam que,
após controle de variáveis como o estado de saúde da pessoa, a frequência a
serviços religiosos esteve associada a um aumento médio de 37% na probabilidade
de sobrevida em doenças como o câncer. O desafio é entender exatamente como
isso acontece.
Uma
das explicações propostas é a ativação do chamado eixo “psiconeuroimunoendócrino”,
em que uma emoção positiva seria capaz de alterar a produção de hormônios que,
por exemplo, reduziriam a pressão arterial. “O impacto da religião e
espiritualidade sobre a mortalidade tem se mostrado maior que a maioria das
intervenções, como o tratamento medicamentoso da hipertensão arterial ou o uso
de estatinas”, afirma Alexander Moreira-Almeida, professor de psiquiatria da
Universidade Federal de Juiz de Fora.
Outro
estudo recente publicado na revista Cancer,
da Sociedade Americana de Câncer, revisou dados obtidos com mais de 44 mil
pacientes e concluiu que são os aspectos emotivos da espiritualidade e da
religiosidade aqueles que mais trazem benefícios para a saúde física e mental
de pacientes com a doença. O mesmo não acontece quando o paciente se dedica a
meramente estudar ou pesquisar sobre a religião.
Ao
mesmo tempo, segundo Almeida, as crenças religiosas também podem atuar de modo
negativo, quando enfatizam a culpa e a aceitação acrítica de ideias ou
transferem responsabilidades. “Piores desfechos em saúde são observados quando
há uma ênfase na culpa, punição, intolerância, abandono de tratamentos médicos.
A existência de conflitos religiosos internos no indivíduo ou em relação à sua
comunidade religiosa também está associada a piores indicadores de saúde.”
Por
essa razão, é importante que os profissionais tenham em conta a dupla natureza
da religião e da espiritualidade, segundo Kenneth Pargament, professor de
psicologia clínica na Bowling Green State University (Ohio). “Elas [religião e
espiritualidade] podem ser recursos vitais para a saúde e o bem-estar, mas também
podem ser fontes de perigo”, diz ele, que esteve no Brasil neste mês falando sobre
o assunto no início do mês no Congresso Brasileiro de Psiquiatria.
Ele
lembra que, por muitos anos, psicólogos e psiquiatras evitaram a religião e a
espiritualidade na prática clínica. Entre
as razões, estaria a antipatia pela religião que sempre houve entre os ícones
da psicologia, como Sigmund Freud. [Que estrago certos ícones podem fazer, perpetuando suas crenças e descrenças por meio de seus seguidores...]
Para
Pargament, é importante a compreensão de que a religião e a espiritualidade são
entrelaçadas no comportamento humano e que os profissionais precisam estar
preparados para avaliar e abordar questões que surjam no tratamento. “Para
muitas pessoas, a religião e a espiritualidade são recursos-chave que podem
facilitar seu crescimento. Para outros, são fontes de problemas que precisam
ser abordadas durante o tratamento. Isso precisa ser compreendido pelos
profissionais de saúde.”
Entre
as técnicas que estão sendo estudadas para essa abordagem estão programas, por
exemplo, para ajudar pessoas divorciadas a lidar com amargura e raiva, ou
vítimas de abuso sexual e mulheres com distúrbios alimentares.
Nota:
A verdadeira religião tem que ver com a “religação” com Deus e uma vida
harmoniosa em quatro áreas básicas: espiritual, mental, física e social. A base
da religião de Cristo é o amor (a Deus e ao próximo), o que resume/sintetiza os
Dez Mandamentos. Quando vivemos a verdadeira religião bíblica, com seu foco na
graça (perdão) e na obediência nascida do amor, a saúde mental e física é uma
consequência natural. Os cientistas ainda não sabem exatamente por que a
religião traz saúde. Simples: porque fomos criados para crer. Negar essa
dimensão humana é convidar a doença. [MB]