sexta-feira, maio 31, 2019

Marcelo Gleiser: panteísta?


Em março, publiquei aqui no blog Criacionismo.com.br e no meu canal no YouTube um texto e um vídeo nos quais comentei a respeito da premiação do físico brasileiro Marcelo Gleiser com o Prêmio Templeton 2019. No passado, Gleiser se declarou ateu, e por isso a premiação causou certa estranheza, afinal, o Prêmio Templeton é uma espécie de “Oscar da espiritualidade”, ou seja, reconhece desde 1972 pessoas que, na opinião dos juízes, deram “uma contribuição excepcional para a afirmação da dimensão espiritual da vida, seja por meio de introspecção, descoberta ou trabalhos práticos”. Além de Gleiser, Madre Teresa, Dalai Lama, o Arcebispo Desmond Tutu e outros figuram no rol dos laureados.

Em março, eu disse que, como brasileiro, sinto-me orgulhoso pela conquista de Gleiser. Como admirador de seu primeiro livro A Dança do Universo (que li logo após seu lançamento, nos anos 1990), alegro-me com ele por essa premiação. Mas, como criacionista, não posso me esquecer das muitas críticas que ele fez ao modelo conceitual que eu advogo há quase 30 anos. A pior delas foi chamar de “criminosos” os que ensinam o criacionismo (confira). Mas tudo bem. Quem sabe sejam águas passadas, já que o físico tem se mostrado bem mais flexível em assuntos de fé, talvez até mesmo motivado pela premiação.

Prova disso foi que na quarta-feira (29), durante a entrega do prêmio e do polpudo cheque de mais de cinco milhões de reais, Gleiser disse o seguinte: “Mantenho a mente aberta para surpresas. Depende do que você chama de Deus. Tem gente que diz que é a natureza. Então, se Deus é a natureza, eu sou uma pessoa religiosa.” Assim, de ateu ou agnóstico, Gleiser passa a ser uma espécie de panteísta – aqueles que veem deus “diluído” na natureza. Ao mesmo tempo que continua provavelmente resistindo à existência de um Deus pessoal como o bíblico, Gleiser abre-se para a devoção ao deus natureza dos panteístas.

Espero que a mente brilhante do físico continue aberta para supressas, e que logo ele possa realmente ter uma grande surpresa, como tiveram homens da ciência e da filosofia como Francis Collins e Antony Flew, ateus expoentes em seus campos de atuação que acabaram por reconhecer a existência de Deus – não o deus-natureza, mas o Criador dela.

Michelson Borges

Não existe pôr do sol na Terra plana

Ontem, ao sair do meu trabalho na Casa Publicadora Brasileira, deparei-me com esse espetáculo da natureza: um lindo pôr do sol. É impossível não pensar no Criador ao ver nossa estrela mais próxima desaparecer no horizonte terrestre pintando o céu com cores de fogo. Saindo do estado poético, pensei também em outra coisa…
Conforme meu amigo astrofísico Eduardo Lütz, não existe pôr do sol assim em modelos terraplanistas coerentes. Isso porque, geometricamente, é impossível que o Sol desapareça no horizonte se ele está apenas circulando sobre o disco. Mas ele não poderia simplesmente parecer tão próximo do horizonte que desapareceria, na prática? Depende da altura dele, do tamanho da Terra e do raio da trajetória do Sol. Temos dados sobre isso para usar no contexto terraplanista? Temos. E precisamos usar esses dados para verificar se o modelo terraplanista é coerente internamente e com o que se observa.
É comum que terraplanistas apresentem um modelo no qual vivemos sobre um disco com centro no polo norte e borda na Antártida. O Sol seria como um holofote que percorre uma trajetória aproximadamente circular sobre o disco (mas que estranhamente não assume formato de elipse nem diminui de tamanho à medida que se afasta de nós). Precisa ser um holofote, pois, se não fosse, seria dia o tempo todo em toda a Terra, por causa dos resultados que mostraremos a seguir.

quinta-feira, maio 30, 2019

Criacionismo é ciência?


Podem os cientistas ser imparciais e objetivos em suas pesquisas em busca da verdade? Francis Bacon acreditava que sim. Na concepção dele, os cientistas deveriam esvaziar a mente de quaisquer ideias preconcebidas e simplesmente se deixar guiar pelos dados rumo à verdade. Mais tarde, Karl Popper referiu-se a essa ideia como “o dogma ingênuo de Bacon”. Para Popper, o método mais adequado a ser adotado na pesquisa científica era exatamente o oposto: ao deparar-se com algum problema, o cientista não deveria esvaziar a mente, mas buscar nela alguma teoria que pudesse explicar sua observação.[1]

Popper afirmou ainda que a crença de que a ciência avança da observação para a teoria (como as pessoas costumam pensar que acontece) é absurda. Ele argumentou que a observação nunca é neutra, sendo sempre influenciada pelos interesses teóricos, as conjecturas e antecipações, e as teorias aceitas como pano de fundo pelo cientista.[2] Ou seja, a ideia de Popper é que o cientista, assim como qualquer outra pessoa, não é imparcial e que sua imparcialidade afeta suas pesquisas, já que seu ponto de vista acaba direcionando em algum grau suas observações, tornando-as, portanto, seletivas. Como forma de corrigir esse viés inevitável na ciência, Popper propôs o princípio da falseabilidade (adotado até os dias atuais), que consiste na tentativa, por parte da comunidade científica, de refutar, através de experimentos, hipóteses defendidas em pesquisas acadêmicas.[3] Caso essa tentativa seja bem-sucedida, diz-se que tais hipóteses foram falseadas (rejeitadas). Caso contrário, elas ganham o status de corroboradas. É dessa forma que a ciência progride, apesar do viés inerente a cada cientista.

O princípio da falseabilidade foi definido por Popper como o “critério de demarcação” da ciência – o delimitador do que é ou não ciência.[3] Logo, o que define o caráter científico de uma teoria não é sua origem, mas, sim, sua capacidade de fazer previsões (hipóteses) testáveis.[1] Sendo assim, podemos concluir que é cientificamente válido para um cientista adotar a cosmovisão criacionista ou evolucionista em suas pesquisas. A questão que surge aqui, portanto, é: O criacionismo pode fornecer hipóteses que possam ser submetidas à prova por meio de experimentação?

O projeto de pesquisa que vem sendo desenvolvido há cerca de 20 anos em uma região desértica, próxima à cidade de Ocucaje, no sul do Peru, por um grupo de cientistas criacionistas, que tem resultado na publicação de artigos em renomadas revistas científicas,[4, 5, 6] pode nos ajudar a responder essa pergunta. Leonard Brand, Raúl Esperante, Arthur Chadwick e outros analisaram minuciosamente centenas de fósseis de cetáceos (principalmente baleias) e outros animais marinhos dessa região, os quais são encontrados em várias camadas de rochas sedimentares da Formação Pisco (das épocas geológicas Mioceno e Plioceno). A pesquisa lhes permitiu constatar que tais espécimes fósseis apresentam, em geral, ótimo estado de preservação, o que os levou a concluir que essas baleias foram soterradas rapidamente, em um período de semanas a meses. Os dados que lhes permitiram formular essa hipótese são apresentados, de forma resumida, a seguir:

- Os sedimentos em que as baleias foram soterradas contêm inúmeras frústulas (carapaças de silício) de diatomáceas (algas marinhas) que não apresentam evidência de dissolução.

- Várias baleias fossilizadas caracterizam-se pela excepcional ocorrência de barbatanas fósseis (como as barbatanas não são tão resistentes quanto os ossos, elas rapidamente são deterioradas, sendo raras no registro fóssil) e ainda na posição de vida (observações em oceanos modernos demonstram que após a morte da baleia as barbatanas se destacam da gengiva da mandíbula superior em um intervalo de horas a semanas).

- Os ossos das baleias em geral estão bem articulados (em sua posição original), e não apresentam sinais de corrosão ou perfuração por vertebrados ou invertebrados, ou qualquer outro dano pós-morte.

- A maioria das baleias fósseis apresentam esqueleto completo e estão com o ventre virado para baixo (observações de carcaças de baleias à deriva no oceano demonstram que durante o processo de putrefação gases são produzidos em seu interior, fazendo-as inchar e rotacionar, chegando ao leito oceânico com o ventre virado para cima; o fato de as baleias da Formação Pisco não estarem nessa posição sugere que não houve muito tempo entre sua morte e soterramento).

- Não há evidência de bioturbação por invertebrados marinhos nos sedimentos que circundam os fósseis de baleias (nos dias de hoje, carcaças de baleias situadas no fundo oceânico são rapidamente colonizadas por invertebrados marinhos que, além de remover a carne e degradar os ossos, também perturbam os sedimentos adjacentes em busca de compostos orgânicos lixiviados das baleias).

Apesar de a geologia convencional (evolucionista) já admitir também a possibilidade de catástrofes ao longo da história geológica do planeta (atualismo), ainda é evidente a preferência de geólogos que trabalham dentro dessa cosmovisão por explicações que demandam muito tempo (milhões de anos), o que muito provavelmente se deve à grande confiança que depositam na datação radiométrica. No caso dos fósseis da Formação Pisco, por exemplo, inúmeros pesquisadores já os haviam estudado, no decorrer de décadas, mas nenhum deles havia notado (ou aceitado) as várias evidências que apontam fortemente para um rápido soterramento. As evidências sempre estiveram diante dos olhos deles, mas suas pressuposições os guiaram para longe da verdade. Por outro lado, em função da hipótese criacionista de altas taxas de sedimentação e rápida fossilização (derivada da crença no dilúvio e na vida recente na Terra, e da suspeita de um erro sistemático na datação radiométrica), os pesquisadores criacionistas puderam realizar descobertas significativas.

Este exemplo (que é apenas um de vários) demonstra que, além de fornecer hipóteses testáveis, o criacionismo tem ainda sido corroborado quando submetido à prova por meio de experimentos, podendo ser classificado, portanto, como ciência.

(David Ramos Pereira é geólogo e mestre em Geologia e Geoquímica pela UFPA)

Referências:
1. Brand, L. (2009). Faith, reason, and earth history: a paradigm of earth and biological origins by intelligent design. Andrews University Press.
2. Popper, K. R. (1982). Conjecturas e Refutações: o progresso do conhecimento científico; trad. Sérgio Bath. Brasília: Editora Universidade de Brasília.
3. Popper, K. (2005). The logic of scientific discovery. Routledge.
4. Brand, L.R., Esperante, R., Chadwick, A.V., Poma, O., Alomía, M., 2004. Fossil whale preservation implies high diatom accumulation rate in the Miocene–Pliocene Pisco Formation of Peru. Geology 32, 165–168.
5. Esperante, R., Brand, L.R., Nick, K.E., Poma, O., Urbina, M., 2008. Exceptional occurrence of fossil baleen in shallow marine sediments of the Neogene Pisco Formation, Southern Peru. Palaeogeogr. Palaeoclimatol. Palaeoecol. 257, 344–360.
6. Esperante, R., Brand, L. R., Chadwick, A. V., & Poma, O. (2015). Taphonomy and paleoenvironmental conditions of deposition of fossil whales in the diatomaceous sediments of the Miocene/Pliocene Pisco Formation, southern Peru–A new fossil-lagerstätte. Palaeogeography, Palaeoclimatology, Palaeoecology417, 337-370.

quarta-feira, maio 29, 2019

A [R]evolução científica de 29 de maio de 1919

29 de maio de 1919 é a data chave para a abertura de um capítulo importante da história, não apenas da ciência, mas de toda a humanidade. O registro fotográfico da deflexão da luz correspondente ao eclipse ocorrido nessa data, abriu um amplo campo de possibilidades de desenvolvimento científico, influenciando o cotidiano do ser humano de forma direta e profunda há exatamente cem anos. As fotografias desse eclipse estabeleceram uma das primeiras bases experimentais para a confirmação de aspectos fundamentais da Teoria Geral da Relatividade, de Albert Einstein (1879-1955). A partir de então, ferramentas tecnológicas que favorecem a instrumentalização da energia nuclear e o uso do GPS, entre outras inovações, tornaram-se possíveis, mudando efetivamente o modus operandi da Idade Contemporânea.

O princípio da Teoria Geral da Relatividade está no coração de muitos dispositivos médicos, como os scanners para tomografia por emissões de pósitrons (PET), usados para encontrar tumores; também está em aparelhos domésticos, como televisores e alarmes de fumaça. Ainda nesse sentido, uma perspectiva significativa para a teoria de Einstein está no seu poder para a explicar como as estrelas se inflamam e nosso planeta se aquece; e como buracos negros são criados.[1]

No entanto, as peças da linha de montagem da teoria que revolucionou a história dos dois últimos séculos não começam a ser engendradas por um funcionário público alemão em um escritório de patentes em Berna, na Suíça de 1905. Einstein desenvolveu a teoria geral “para explicação da realidade”, como uma metonímia da busca da ciência ao conhecimento pleno do mundo físico, e ele próprio menciona que essa odisseia científica é semelhante a uma história de mistério perfeito em que se procura por “uma solução completa antes de sua revelação pelo autor no fim do livro”.[2]

Segundo Einstein e Infeld, a despeito de todos os volumes lidos e compreendidos, ainda estamos longe de uma solução completa, e em cada etapa tentamos encontrar uma solução geral compatível com todas as pistas conhecidas. Quanto mais lemos, tanto mais plenamente apreciamos a perfeita construção do livro, muito embora a solução completa pareça recuar ao avançarmos. Para obter até mesmo uma solução parcial o cientista tem de coligir os fatos desordenados disponíveis, tornando-os coerentes e compreensíveis pelo pensamento criador.[3]

A linha histórica de montagem da Teoria Geral Relatividade possui peças que podem nos remeter à formação dos rudimentos da linguagem matemática, entretanto, Galileu Galilei (1564-1642) e Isaac Newton (1643-1727) são catalisadores na aceleração do processo de descoberta científica quando substituem o ponto de vista intuitivo pelo pensamento consistente com uma observação padronizada pela linguagem matemática, ao desenvolverem a lei da inércia em contrapartida à definição intuitiva de movimento de Aristóteles. Dentro dessa perspectiva, conforme afirma Einstein, há apenas quatrocentos anos os cientistas começaram a entender a linguagem da história:

Desde esse tempo, a época de Galileu e Newton, a leitura prosseguiu rapidamente. Foram desenvolvidas técnicas de investigação e métodos sistemáticos de encontrar e seguir pistas. [...] A descoberta e o uso do raciocínio científico por Galileu foram uma das mais importantes conquistas da história do pensamento humano e marcam o começo real da Física. Essa descoberta nos ensinou que as conclusões intuitivas baseadas na observação imediata nem sempre devem merecer confiança, pois algumas vezes conduzem a pistas erradas. [...] A experiência idealizada jamais pode ser realmente levada a efeito, embora conduza a uma profunda compreensão das experiências reais. O pensamento humano cria um quadro sempre mutável do Universo. A contribuição de Galileu consistiu em destruir o ponto de vista intuitivo, substituindo-o por outro novo.”[4]

Partindo desse pressuposto, é possível estabelecer um esboço com uma breve descrição histórica da linha do tempo que conduz a ciência do raciocínio científico de Galileu à Teoria Geral da Relatividade de Einstein:

 1607 – Galileu Galilei (1564-1642) chega a uma formulação matemática da lei da queda de objetos com base em suas experiências anteriores.[5]
 1609 – Johannes Kepler (1571-1630) descreve o movimento dos planetas ao redor do Sol, conhecido atualmente como “as leis do movimento planetário de Kepler”.[6]
 1640 – Ismaël Bullialdus sugere uma lei de força gravitacional quadrática-inversa.[7]
 1676 – Ole Rømer (1644-1710) estabelece a primeira medida quantitativa da velocidade da luz.[8]
 1665 – Isaac Newton (1643-1727) introduz a lei quadrática-inversa em sua lei de gravitação universal, unificando as teorias de movimento terrestres e celestes, e usando esse princípio para calcular a órbita da Lua e o arco parabólico de projéteis.[9]
 1684 – Isaac Newton prova que os planetas se movem sob uma lei de força gravitacional quadrática-inversa, que obedece às leis de Kepler.[10]
 1686 – Gottfried Wilhelm Leibniz (1646-1716) afirma que a energia cinética é proporcional à velocidade ao quadrado ou que a velocidade é proporcional à raiz quadrada da energia.[11]
 1744 – Pierre Louis Moreau de Maupertuis (1698-1759) publica seu tratado concernente ao princípio da ação mínima, proposto com base em ensinamentos bíblicos sobre Deus e o que Ele faz. Esse princípio estabelece a otimização das leis físicas, o que permite deduzir equações que as descrevem, como as da mecânica newtoniana, da Teoria Eletromagnética e da Relatividade Geral.[12]
 c.1755 – Leonhard Paul Euler (1707-1783) e Joseph-Louis Lagrange (1736-1813) instrumentalizam o princípio da ação mínima para deduzir as equações diferenciais das leis físicas, representadas pelas equações de Euler-Lagrange.[13]
 1749 – Emilie du Chatêlet (1706-1749) completa sua tradução para o francês do Philosophiae Naturalis Principia Mathematica de Newton, incluindo sua noção de conservação de energia, e ampliando a visão concernente à relação entre massa e velocidade.[14]
 1833 – William Rowan Hamilton (1805-1865) desenvolve a mecânica hamiltoniana, ampliando o método de Euler e Lagrange, estabelecendo a definição moderna de energia. A partir de Hamilton, a energia é conceituada como um sistema físico responsável por qualquer alteração ao longo do tempo.[15]
 1774 – Antoine-Laurent de Lavoisier (1743-1794) comprova a Lei da Conservação das Massas.[16]
 1798 – Henry Cavendish (1731-1810) mede a força da gravidade entre duas massas, apresentando o primeiro registro histórico de um valor preciso para a constante gravitacional.[17]
 Michael Faraday (1791-1867), um influenciador direto de James Clerk Maxwell, começa a estudar as relações entre a eletricidade e o magnetismo.[18]
 1827 – André-Marie Ampère (1775-1836) publica Mémoire sur la théorie mathématique des phénomènes électrodynamiques uniquement déduite de l'experience, fundando a eletrodinâmica.[19]
 1855 – James Clerk Maxwell (1831-1879) começa a desenvolver um trabalho teórico visando a unificar a luz, a eletricidade e o magnetismo.[20] As equações dele serão fundamentais para o desenvolvimento da Teoria Geral da Relatividade.[21]
 1855 – Urbain Le Verrier (1811-1877) observa uma precessão no periélio de Mercúrio e atribui erroneamente à existência de outro planeta, que supostamente interferiria em sua órbita.[22]
 1867 – Os estudos de Georg Friedrich Bernhard Riemann (1826-1866) sobre Geometria Diferencial, essenciais para a formulação da Teoria Geral, são publicados postumamente.[23]
 1892 – Hendrik Lorentz (1853-1928) publica uma pesquisa sobre o movimento relativo da terra e do éter, sendo esse último um conceito hipotético em voga, na época.[24]
 1900 – Formulação do Cálculo Tensorial, por Gregorio Ricci-Curbastro (1853-1925) e Tullio Levi-Civita (1873-1941), elemento-chave para o conceito de curvatura do espaço.[25]
 1904 – Henri Poincaré apresenta o princípio da relatividade, que havia sido denominado quatro anos antes de o princípio do movimento relativo.[26]
 1905 – Albert Einstein completa a Teoria da Relatividade Especial e determina a lei da proporcionalidade entre energia e massa: E = mc2.[27]
 1915 - Albert Einstein completa a Teoria Geral da Relatividade, explicando com precisão a precessão do periélio de Mercúrio.[28]
 1919 – Arthur Eddington lidera uma expedição que afirma detectar a deflexão gravitacional da luz do Sol, por meio do registro de algumas fotografias do eclipse de 29 de maio de 1919.[29]

A partir da data de confirmação da deflexão da luz com o ângulo previsto, a Teoria Geral da Relatividade ganhou vida própria. Em 1939, no limiar da Segunda Guerra Mundial, Lise Meitner (1868-1978) publicou, juntamente com Otto Robert Frisch (1904-1979), uma pesquisa referente à desintegração do urânio, como o prenúncio de um desdobramento sombrio para a aplicação prática da teoria de Albert Einstein.[29]

Seis anos depois, duas bombas atômicas caíram sobre Hiroshima e Nagasaki e, nos últimos trinta anos, testemunhamos duas grandes catástrofes com usinas nucleares. Como diria Einstein, todo o nosso progresso tecnológico parece ser “como um machado nas mãos de um demente”.[30] Essa é uma prova patente de que uma grande força necessita de grande autocontrole.

IMPLICAÇÕES CRIACIONISTAS DA TEORIA GERAL DA RELATIVIDADE

As equações das leis do eletromagnetismo permitiram a dedução de características fundamentais do espaço-tempo por Lorentz e Poincaré, as quais foram utilizadas por Einstein na formulação da Relatividade Especial. Uma das consequências da Relatividade Especial é a famosa fórmula E=mc².

Esses estudos desdobraram-se em pesquisas que resultaram na formulação da Relatividade Geral. Einstein utilizou o princípio da ação mínima para deduzir a equação de uma lei que relaciona energia com a curvatura do espaço-tempo. Combinando-se essa equação com as leis da Relatividade Especial aplicadas ponto a ponto no espaço-tempo, obtém-se a Relatividade Geral.

Essa teoria (ou conjunto de leis), por sua vez, possui várias implicações notáveis. Entre elas, podem-se citar buracos negros, “buracos de minhoca” (buracos de verme), ondas gravitacionais, lentes gravitacionais e equações que dizem que o Universo foi criado e vem se expandindo desde então. Este último conjunto de equações é popularmente conhecido como “Teoria do Big Bang”, e é um dos modelos mais mal-entendidos do último século.

O modelo do Big Bang é possivelmente o desdobramento da Relatividade Geral com maiores implicações para o materialismo e para o criacionismo. Até à época da formulação da Relatividade Geral, era comum a crença de que o Universo fosse eterno. A descoberta da Relatividade Geral implica, por meio de constatação, no princípio de que o Universo não pode estar em equilíbrio desde sempre e que tende a se expandir ou se contrair.

Diversos pesquisadores, como o próprio Einstein, Friedmann e outros, trabalharam para encontrar uma solução na qual o Universo fosse estável e eterno. Não foi possível. Einstein chegou a pensar que havia cometido erros de cálculo na dedução da equação da Relatividade Geral. Na verdade, ele havia mesmo omitido um termo que poderia ser importante, mas o acréscimo daquele termo não modificou as consequências da equação quanto à eternidade do Universo. É importante destacar que, quando falamos em Universo nesse contexto, não nos referimos ao material presente no Universo, mas ao tempo e ao espaço em si.

Em 1927, o padre belga Georges Henri Joseph Édouard Lemaître (1894-1966) publicou um trabalho no qual refazia os cálculos com cuidado e incluía também as leis da Termodinâmica. Isso permitiu a formulação de um modelo mais realista com a eliminação de soluções da equação de Einstein que fossem incompatíveis com aquelas leis.

O conjunto de equações resultante mostrava um universo que foi criado em algum momento do passado e expandia-se desde então. Lemaître verificou ainda as consequências mensuráveis daquele sistema de equações, e uma delas é o fenômeno que ocorre ao observarmos grupos de objetos muito distantes no Universo. Quanto maior for a distância desses objetos, maior será o avermelhamento deles. Isso pode ser observado pelas medidas dos comprimentos de onda do espectro de elementos conhecidos presentes na luz vinda de objetos distantes. Lemaître incluiu em seu trabalho essas observações e notou que a curva de avermelhamento observada estava de acordo com a previsão teórica do modelo.

Ainda sobre a lei do avermelhamento, Edwin Powell Hubble (1889-1953) publicou, em 1929, observações que a confirmavam e, por meio desse estudo, o próprio Einstein convenceu-se de que o Universo (espaço-tempo) não é eterno. O modelo de Lemaître continuou a ser visto com grande ceticismo e até desdém por parte de muitos no mundo acadêmico, chegando mesmo a ser chamado de “Big Bang” em um deboche feito por Fred Hoyle (1915-2001). E o modelo ficou conhecido por esse nome até os dias atuais. Com o tempo, porém, mais e mais previsões do modelo foram observadas até o ponto em que praticamente deixou de ser razoável desprezá-lo.

Um fator fundamental, que induz muitos criacionistas a combater o Big Bang, está contido na ideia de que esse modelo nos diz que o Universo tem quase 14 bilhões de anos de idade; no entanto, o modelo do Big Bang não determina essa idade para o Universo e a Bíblia também não fornece uma datação precisa. O que converge para a hipótese de que o  Universo é realmente antigo é o grande número de observações do espaço profundo.

Resumindo, em contraposição aos erros conceituais, resta o fato de que uma lei física importante, correspondente à equação fundamental da Relatividade Geral, implica em um universo criado,[31] o que marca pontos para o criacionismo. Se o desenvolvimento científico tem sido mal-utilizado, em algumas ocasiões, “como um machado nas mãos de um demente”, a premissa de um Criador que ama até o fim conduz aquele que assim desejar para a segurança de Quem conhece o fim desde o começo.

(Flávio Pereira da Silva Filho, pós-graduado em Teologia Bíblica pelo Centro Universitário Adventista de São Paulo (Unasp); bacharel em Comunicação Social, com habilitação em Jornalismo, pela UFMA-MA e em Teologia pelo Unasp)

Referências:
1. Ver: Bodanis, David. E=Mc²: A Biography of the World's Most Famous Equation. New York: Walker, 2000. p. ix.
2. Ver: Einstein, Albert; Leopold Infeld. The Evolution of Physics: The Growth of Ideas from Early Concepts to Relativity and Quanta. Cambridge: U.P., 1971. p. 3.
3. Einstein, Albert; Leopold Infeld. A Evolução da Fisica. Rio de Janeiro (RJ): Zahar, 1976. p. 14.
4. Idem, pp. 15-17.
5. Ver: Drake, Stillman. Galileo at Work: His Scientific Biography. Chicago: University of Chicago Press, 1982. pp. 126, 127.
6. Ver: Kepler, Johannes; Tycho Brahe. Astronomia Nova Aitiologetos. Heidelberg: G. Voegelinus, 1610.
7. Boulliau, Ismael. Astronomia Philolaica. Parisiis: Piget, 1645. p. 23.
8. Römer, Ole. Vitesse de la Lumière. Disponível em: https://archive.org/details/47Romer. Acesso em 28 de maio de 2019. Ver também: Francis Beaubois, “Rœmer et la vitesse de la lumière”, Bibnum [En ligne], Physique, mis en ligne le 01 juillet 2014. Disponível em: http://journals.openedition.org/bibnum/688. Acesso em 28 de maio de 2019.
9. Ver: Jeans, James. The Growth of Physical Science. Cambridge: University Press, 1947. pp. 184, 185.
10. Ver: Newton, Isaac. De motu corporum in gyrum. The Newton Project. University of Oxford. Disponível em: http://bit.ly/motucorporum. Acesso em: 28 de maio de 2019. Ver também: Newton, Isaac. MS Add.3965. Cambridge University Library. Disponível em: http://bit.ly/motucorporum0. Acesso em 28 de maio de 2019.  
11. Iltis, Carolyn Merchant. The Controversy Over Living Force: Leibniz to D'Alembert. Ph.D. diss., University of Wisconsin, 1967. pp. 1, 4, 69-71.
12. A expressão formal (fórmula) deste princípio permite deduzir leis físicas e tem tido importância estratégica para as pesquisas mais avançadas até os dias atuais. Trata-se de uma contribuição criacionista à pesquisa científica. Ver: P. L. M. Maupertuis. Accord de différentes loix de la nature qui avoient jusqu'ici paru incompatibles. Institut de France, 1748. pp. 417-426.
13. Lagrange, J. L. Mécanique analytique, v. 1 e 2. Paris: Librairie Pour Les Mathématiques, 1811.
14. Du Châtelet, Gabrielle Emilie; Newton, Isaac. Principes mathématiques de la philosophie naturelle, 1. Paris: Desaint & Saillant, 1759. Du Châtelet, Gabrielle Émilie; Newton, Isaac (1642-1727). Principes mathématiques de la philosophie naturelle, 2. Paris: Desaint & Saillant, 1759. Ver também: Du Châtelet, Gabrielle Emilie; Chazal, Gérard. Institutions de physique. Paris, France: Prault, 1740. Du Châtelet, Gabrielle Emilie. Dissertation sur la nature et la propagation du feu. Prault. Paris, France: Prault, 1744. p. 31.
15. Estas pesquisas tornaram-se significativas especialmente em futuros estudos na área da Mecânica Quântica. O seu trabalho em quatérnios, um sistema numérico desenvolvido  por ele, é seminal para os futuros avanços na área da relatividade. Ver: Hamilton, Sir William Rowan. On a general method in dynamics. London: Richard Taylor, 1834. Ver também: Hamilton, William Rowan. Elements of quaternions. London: Longmans, Green & Company, 1866.
16. Lavoisier, Antoine. Traité élémentaire de chimie, v. 1.  París: Chez Cuchet Libraire, 1789. pp. 140, 141.
17. Newton, Isaac et al. The Laws of Gravitation: Memoirs by Newton, Bouguer and Cavendish, Together with Abstracts of Other Important Memoirs. New York: American book Company, 1900. pp. 57-102.
18. Faraday, Michael; Martin, Thomas. Faraday's Diary. London: G. Bell and Sons, 1932. pp. 49-57.
19. Ampère, André Marie. Mémoires sur l'électromagnétisme et l'électrodynamique. Les maitres de la pensée scientifique, v. 9. Paris: Gauthier-Villars, 1921.
20. Maxwell, James Clerk. On Faraday's Lines of Force. Transactions of the Cambridge Philosophical Society, v. 10. Cambridge: University Press, 1856. pp. 155-229.
21. Maxwell formulou a Teoria Eletromagnética, permitindo a descoberta de consequências contraintuitivas das leis do eletromagnetismo, tais como a dilatação do tempo e a contração do espaço, conforme demonstrado por Lorentz. Isso foi o que realmente abriu as portas para a Relatividade Especial.
22. Le Verrier, U. J. Recherches sur l'orbite de Mercure et sur ses perturbations. Détermination de la masse de Vénus et du diamètre du Soleil. Journal de mathématiques pures et appliquées, Paris: Bachelier, 1843. p. 273-359.
23. Riemann, Bernhard.  Ueber die Hypothesen, welche der Geometrie zu Grunde liegen. Disponível em: http://bit.ly/riemann1867. Acesso em 29 de maio de 2019.
24. Lorentz, H. A. The Relative Motion of the Earth and the Aether. Disponível em: http://bit.ly/relativemotion. Acesso em 29 de maio de 2019.  
25. Tullio Levi-Civita. Encyclopædia Britannica. Disponível em: http://bit.ly/tensorcalculus. Acesso em 29 de maio de 2019.  
26. Poincaré, Henri. The principles of mathematical physics. The Monist, v. 15, 1. Boston: Houghton, Mifflin: 1905. pp. 1-24.
27. Einstein, Albert. Zur elektrodynamik bewegter körper. Annalen der physik, v. 322, 10. Leipzig: 1905. pp. 891-921.
28. Einstein, Albert. Die Grundlage der allgemeinen Relativitätstheorie. Annalen Der Physik, v. 49, 7. 1916. pp. 769-822.
29. Lights All Askew in the Heavens. Men of Science More or Less Agog Over Results of Eclipse Observations. Einstein Theory Triumphs. New York Times, May 29, 1919.
30. Meitner, Lise; Frisch, Otto Robert. Disintegration of uranium by neutrons: a new type of nuclear reaction. A Century of Nature: Twenty-One Discoveries that Changed Science and the World, p. 70-72, 1939.
31. Einstein, Albert. Albert Einstein, the human side: New glimpses from his archives. Princeton University Press, 1981. p. 88.
32. Nesse sentido a fundamentação grega da expressão “κατηρτίσθαι τοὺς αἰῶνας ῥήματι θεοῦ”, de Hebreus 11:3, converge para o conceito de criação do tempo.