"Quebrou a cara" no Brasil |
Quando pretendia deixar o Brasil no dia 28 num voo para Los
Angeles, o biólogo ateu militante Richard Dawkins tropeçou, machucou o rosto,
levou cinco pontos e não pôde embarcar (confira). No Facebook, um internauta mais maroto chegou a escrever: “Deus é mesmo
brasileiro!” Brincadeiras e provocações à parte, enquanto esteve em nosso país,
Dawkins, que deveria falar sobre ciência, biologia e evolucionismo, não
resistiu e pregou tratou de subjetividades como ateísmo e insultou
criacionistas. Exemplo disso é a entrevista que ele concedeu à revista Galileu. Confira alguns trechos
a seguir [com meus comentários entre colchetes]:
Quando e por que o senhor sentiu a necessidade de se tornar uma
figura pública e advogar contra a religião e o criacionismo?
Bem, como cientista, eu me sinto apaixonado pela verdade [bem,
como criacionista e cristão, eu também]. Eu amo a verdade, ela é tão
empolgante, com certeza você deve concordar, afinal escreve para uma revista. O
criacionismo é um insulto ao intelecto, então qualquer cientista vai querer
lutar contra isso [toda generalização é um insulto ao intelecto. Conheço muitos
cientistas e pesquisadores que defendem o criacionismo e não deixam de ser
cientistas por isso]. Eu nunca quis nada
além de lutar contra o criacionismo [puxa! É a razão da vida dele! Então o
pessoal aqui no Brasil gastou uma grana pra trazer um biólogo que não veio
falar de ciência, mas atacar os criacionistas!]. Nunca decidi me tornar uma
figura pública, mas sempre senti a necessidade de advogar por esta causa e se,
por consequência, me tornei uma pequena figura pública, foi incidentalmente.
[Não, não foi incidentalmente. Dawkins vive de escrever livros, não faz
pesquisas e está sempre na mídia. E ele descobriu o segredo para ser midiático:
a polêmica. Ataque os criacionistas; deprecie Deus; faça campanhas ateístas com
faixas e frases de efeito. Isso vende jornais.]
Existiu algum momento específico de sua vida adulta em que o
senhor tenha se sentido inclinado a acreditar em algo além da ciência?
É claro que eu acredito em várias coisas no sentido da
valorização: eu valorizo a música, valorizo a amizade humana e o amor humano,
valorizo a poesia e todos os tipos de coisas como essas. Mas a crença implica
em acreditar em algo factual, em inglês você pode usar o termo “acreditar” no
sentido de “eu acredito no amor” ou algo do gênero. Eu suponho que você esteja
falando de crença no sentido de acreditar em fatos, e não há nenhuma outra
razão para acreditar em fatos além de evidências científicas. [Que fatos
sustentam a existência de um sentimento como o amor? Quais as vantagens
evolutivas da música, da arte? Num mundo em que a sobrevivência do mais forte
ou mais apto, mais competitivo é um imperativo, por que perder tempo com coisas
como música, pintura ou mesmo amor?]
O senhor consegue imaginar a existência de uma religião que não
seja cega pelo dogma?
Não estou certo de que se chamaria religião neste caso. Eu acho
que normalmente usamos a palavra religião para significar algo como uma fé, que
é, em outras palavras, desprovida de evidências, e eu suponho que isso meio que
signifique dogma. Eu realmente não sei, apenas não tenho interesse por
religião. Isso é uma revista de ciência, não vamos falar sobre ciência?
[Dawkins vive falando em ateísmo e quer puxar a orelha do repórter da Galileu por querer perguntar sobre
religião? A fé não precisa ser desprovida de evidências, como quer Dawkins. O
problema é que a falta de interesse dele pelo assunto faz com que ele ignore as
evidências (talvez a aversão dele à religião tenha outros motivos...). A fé que eu abracei e
defendo é racional e não está fundamentada no vácuo. Tenho muito boas
evidências de que a Bíblia é a Palavra inspirada de Deus; de que Jesus ressuscitou
dos mortos; de que Deus é o Criador do Universo. Mas será que Dawkins já parou
para ouvir esse tipo de coisa? Dificilmente, pois ele vive evitando debates com
apologistas cristão bem preparados.]
É claro que vamos. Em diversas ocasiões, o senhor sugeriu que os
aspectos culturais da religião são uma coisa boa. Como o senhor enxerga o papel
dos mitos em nosso passado e também no presente?
Nunca entendi muito bem o que é um mito, quer dizer, ele é uma
história, e eu suponho que seja uma história com algum significado
antropológico. Uma tribo terá histórias tribais sobre a origem das coisas.
Estou ciente delas, não acho que sejam muito interessantes sob meu ponto de
vista, eu sou um cientista. [Mas acredita no mito segundo o qual o Universo
teria surgido a partir do nada e que matéria inorgânica teria por si só se
organizado para dar origem à vida, com toda a sua complexidade e tremenda
quantidade de informação genética.]
Mas às vezes nossos ancestrais criadores de mitos acertavam em
algumas coisas...
Como o quê?
Como por exemplo o fato de a ciência atual ter comprovado a
existência de um ancestral masculino e feminino comum a todos e chamá-los de Adão e Eva. É claro que
existem diferenças enormes entre a narrativa bíblica e a científica, mas o
senhor acredita que a intuição humana seja capaz de expandir nosso entendimento
sobre o mundo?
Estou impressionado de que você pense que o mito de Adão e Eva
esteja relacionado de alguma maneira com isso [dá-lhe arrogância dawkiniana!]. Como
poderíamos não ter ancestrais masculinos e femininos? Como todos os
mamíferos, nós somos seres sexuais, então obviamente nós temos ancestrais
masculinos e femininos [e como esses ancestrais teriam se originado de seres
vivos assexuados? Nem Dawkins responde]. Quanto ao que os cientistas chamam de
Eva mitocondrial e Adão cromossomial-Y, é logicamente necessário que tenha de
existir uma fêmea individual que seja a ancestral universal de todos nós na
linhagem feminina, não poderia ser de outra forma. E similarmente tem de haver
um ancestral macho que seja nosso ancestral comum mais recente na linhagem
masculina. Esse ancestral seria aquele de quem herdamos todos os nossos
cromossomos Y, e similarmente da mulher herdamos todas as nossas mitocôndrias.
Isso é logicamente necessário, você não precisa de mitos para chegar a esta
conclusão. [Então o relato bíblico se antecipa à ciência, a ciência conclui
depois que é por aí mesmo, e cientistas como Dawkins saem dizendo que o relato
de Gênesis é mito? Ah, Dawkins, de onde surgiram esses primeiros macho e fêmea,
e de onde surgiram os cromossomos e as mitocôndria? Só para lembrar, a
mitocôndrias são minúsculas “usinas” produtoras de energia de alto desempenho.
Surgidas por acaso, claro...]
Quando o senhor forjou o conceito do meme, ele estava a anos de
se tornar um fenômeno generalizado na internet. Recentemente o senhor disse que
os jovens estão perdendo muito ao se limitar apenas às frases de impacto e imagens
engraçadas. Como o senhor descreveria um meme mais elaborado?
Um meme é uma unidade de herança cultural, a ideia é ver se
podemos desenvolver uma analogia com o gene como a unidade da seleção natural
de Darwin. A evolução darwinista, que eu suspeito que, de alguma forma, seja
universal pelo Universo onde quer que haja vida, depende de entidades
auto-replicantes, que em nosso planeta são o DNA. [Veja o que escrevi sobre memes em 2008.]
Qual é a sua opinião atual sobre a influência dos genes no
comportamento humano moderno?
Os genes obviamente são cruciais para o desenvolvimento humano,
é óbvio que nós não estaríamos aqui se não tivéssemos genes. Vou considerar que
você quis dizer diferenças genéticas influenciando diferenças humanas, seria
uma maneira de transformar sua pergunta em algo significativo [esse repórter é
bem paciente com essas respostas ríspidas de Dawkins...]. Até que ponto é
possível explicar as diferenças entre uma pessoa e outra através de seus genes?
Digamos a tendência de ser agressivo, avarento, homossexual, altruísta - para
todas essas características psicológicas seria possível examinar suas variações
em humanos e a contribuição genética para essas variações através de estudos
com gêmeos, por exemplo. Como um todo, a maioria das características
psicológicas acaba tendo um componente genético razoavelmente alto, que não é
cem por cento. [Os genes não são assim tão determinantes quanto Dawkins quer;
há pesquisas recentes em epigenética, por exemplo, mostrando que a coisa é bem
mais complexa do que se pensava quando O
Gene Egoísta foi escrito.]
Algumas pessoas dizem que a epigenética é uma espécie de renascimento
das ideias de Lamarck...
Sim, eu sei que elas dizem, e este é o problema. Isso poderia
ser verdade se ela continuasse por um número indefinido de gerações. Mas é
claro que outro fator para ela ser um ressurgimento do lamarckismo é que seria
necessário que produzisse adaptação, como a que Lamarck visualizou do princípio
de uso e desuso - digamos que quanto mais se usa um músculo, maior ele fica, e
então isso é herdado pela próxima geração. Isso seria a evolução lamarckista.
Não é isso que está sendo falado aqui, ninguém sugeriu que o princípio do uso e
desuso leve ao crescimento de uma parte particular do corpo e seja herdado.
[Ok, mas Dawkins não pode ser tão taxativo a respeito de uma área que mal se
começou a estudar, a epigenética.]
Poderia contar uma ou duas dessas histórias engraçadas que
mencionou [em sua autobiografia]?
Eu desenvolvi a ideia, especialmente mais para o fim do livro,
de que a mínima mudança em quase
qualquer lugar é suficiente para mudar todo o resto da história. Por
exemplo, eu imaginei um dinossauro espirrando em um momento crucial que impediu
que ele pegasse um pequeno mamífero em particular, e aquele mamífero foi em
frente para se tornar o ancestral, o Adão de todos os mamíferos que
sobreviveram, todos nós devemos nossa existência a este espirro hipotético
desse dinossauro do Cretáceo. Eu acho este um pensamento interessante, e tento
jogar pequenas reflexões, pensamentos como este, resultando de história que
conto. [Temos que admitir: Dawkins tem muita imaginação!]
Tem algum arrependimento em sua carreira cientifica?
É difícil isso, não? Eu acho que depois de escrever O Gene Egoísta eu basicamente dei uma guinada para o caminho de escrever livros ao invés da pesquisa [grande problema esse, não para o bolso dele, evidentemente]. Eu cheguei a fazer um pouco mais de pesquisa, mas obviamente não o mesmo tanto que eu teria feito se não tivesse me dedicado a escrever livros. E eu não acho que eu me arrependa disso, de certa forma sim, mas eu provavelmente fiz mais pela ciência ao escrever livros do que teria feito através de uma pesquisa muito restrita que teria sido possível fazer [quanta modéstia!]. Eu nunca teria sido um grande pesquisador, de qualquer forma. [Há quem diga – ateus, inclusive – que nem pensador, nem escritor, nem filósofo ele é...]
O senhor disse uma vez que a ciência é a poesia da realidade. O
senhor é um cientista. Diria que considera a si próprio também um poeta?
Bem, eu não escrevo versos, eu acho que alguns de meus escritos poderiam ser chamados de prosa poética, de um jeito parecido com o que diziam que Carl Sagan escrevia prosa poética [agora ele ofendeu o Sagan!].
Comentário do amigo Frank Mangabeira: “Superinteressante e
reveladora essa afirmação de Richard Dawkins. Nada surpreendente também: mais uma
demonstração de como se entender a psicologia do ateísmo. O ‘cientista’ ateu se
sente insultado pelo modelo criacionista das origens, pautado, em suas
pressuposições, no teísmo bíblico. Sem querer incentivar qualquer disputa
maniqueísta sobre tão polêmico assunto, eu me pergunto: Quem anda insultando
quem? Quem vocifera aos quatros cantos do planeta, de forma apologética, as
ilusões da religião e as ‘verdades’ da evolução? Mais: Onde está a contribuição
verdadeiramente científica de Dawkins para o mundo? Cadê suas pesquisas? Seria
o biólogo de Oxford uma boa referência para tirarmos conclusões acerca de
nossas origens? Duvido. Enquanto isso, criacionistas bem informados, que não se
sentem nem insultados nem intimidados pelo modelo naturalista-metafísico presente
na ciência atual, estão desenvolvendo suas pesquisas com o rigor científico, a
honestidade intelectual e a humildade necessários, a exemplo do Geoscience Research Institute.
“Embora Dawkins afirme que ama a verdade, desconfio da sua ‘verdade’, pois seu dogmatismo ateu é evidente: digno de um fundamentalista extremo. Quem sabe, por trás da ciência de Dawkins, esconda-se o desejo pessoal de que sua visão de mundo seja o paradigma da realidade. Grande pretensão! Mais honesto foi o filósofo ateu Thomas Nagel que, numa confissão franca, trouxe à tona o seu querer: ‘Quero que o ateísmo seja verdadeiro e fico apreensivo com o fato de algumas das pessoas mais inteligentes e bem informadas que conheço serem crentes religiosos. Não se trata apenas de que não creia em Deus e, naturalmente, espero estar certo em minha crença. É que eu espero que não exista nenhum Deus! Não quero que exista um Deus; não quero que o Universo seja assim’ (Nagel 2001, p.130).
“Para Freud, ‘o homem é cego diante do próprio desejo’. Quem são os cegos? Os
criacionistas, os evolucionistas ou ambos? Não se insulte com minha pergunta.
Questione e pesquise com sinceridade, para poder enxergar melhor. Interaja com
visões de mundo diferentes, sem hostilidade, porque a verdade é sempre
engrandecida quando procedemos assim. Aprendemos mais e nosso intelecto se
expande. E cuidado com os desejos...”
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