sexta-feira, julho 10, 2015

Por que o Japão tem uma taxa de suicídios tão alta?

Quando tudo não é suficiente
No ano passado, no Japão, mais de 25 mil pessoas cometeram suicídio. Isso dá uma média de 70 por dia. A maioria delas, homens. Estes números não representam a maior taxa de suicídio entre países desenvolvidos - o título ainda cabe à Coreia do Sul, com uma média anual de 28,9 suicídios por 100 mil habitantes. Mas estão muito acima de outras nações ricas. O índice japonês de 18,5 suicídios para cada 100 mil habitantes é, por exemplo, três vezes o registrado no Reino Unido (6,2) e 50% acima da taxa dos Estados Unidos (12,1), da Áustria (11,5) e da França (12,3). O assunto voltou a ter destaque com a autoimolação de um homem de 71 anos em um trem bala na última terça-feira. O que fez um pacato idoso se matar dessa forma em um vagão lotado? Conforme ele derramava o líquido inflamável sobre si mesmo, teria se afastado de outros passageiros, segundo testemunhas, para não colocá-los em perigo. Alguns disseram que ele tinha lágrimas nos olhos ao fazer isso. Agora, conforme seu passado começa a ser investigado pela mídia japonesa, surgem sinais de se tratar de um homem no limite. Ele vivia sozinho e não tinha emprego. Passava os dias coletando latas de alumínio para vendê-las para reciclagem. Vizinhos disseram a repórteres que o ouviram quebrar uma janela ao se trancar do lado de fora de seu apartamento dilapidado. Outros afirmaram raramente tê-lo visto fora de casa, mas ouviam com frequência a televisão ligada. Pobre, de idade avançada e sozinho. É um caso bastante familiar. ‘ O isolamento é o fator número um que antecede a depressão e o suicídio’ , diz o psicólogo Wataru Nishida, da Universidade Temple, em Tóquio.

“Hoje em dia, são cada vez mais comuns histórias de idosos que morrem sozinhos em seus apartamentos. Eles estão sendo negligenciados. Os filhos costumavam cuidar de seus pais no Japão, mas isso não ocorre mais.” Muitas pessoas costumam citar uma antiga tradição de “suicídio em nome da honra” para a alta taxa do país. Elas citam, por exemplo, a prática samurai de cometer “seppuku” e dos jovens pilotos “kamikazes” de 1945 para explicar por que razões culturais tornam os japoneses mais propensos a tirar a própria vida.

De certa forma, Nishida concorda com este ponto de vista: “O Japão não tem história de Cristianismo. Então, o suicídio não é um pecado. Na verdade, alguns encaram como uma forma de assumir responsabilidade por alguma coisa.”

Ken Joseph, que trabalha no serviço de ajuda a suicidas do país, concorda. Ele diz que sua experiência ao longo dos últimos 40 anos mostra que idosos que têm problemas financeiros podem ver o suicídio como uma saída para esta situação. “Os seguros de vida no Japão são muito ambíguos quanto ao pagamento por suicídio. Então, quando uma pessoa se mata, o seguro costuma ser pago”, afirma Joseph. “Os idosos vivem sob uma pressão intolerável e acreditam que o melhor que podem fazer é tirar a vida para sustentar a família.”

Por causa disso, alguns especialistas acreditam que a taxa de suicídios no Japão é na verdade muito mais alta do que os registros mostram. Muitos casos de idosos que morrem sozinhos nunca chegam a ser completamente investigados pela polícia. De acordo com Joseph, a prática quase universal no país de cremar os corpos também significa que qualquer evidência de um suicídio é rapidamente destruída.

Mas não são apenas os idosos homens com problemas financeiros que estão tirando a vida. O índice vem crescendo rapidamente entre homens jovens, fazendo com que o suicídio seja a principal causa de morte entre os homens japoneses com idades entre 20 e 40 anos. E as evidências apontam que esses jovens estão se matando porque perderam completamente a esperança e são incapazes de pedir ajuda.

Os números começaram a crescer após a crise financeira asiática de 1998 e aumentaram novamente após a crise financeira mundial de 2008. Especialistas acreditam que esses aumentos estão ligados a um crescimento das “condições precárias de emprego”, em que jovens são contratados por curtos períodos de tempo.

O Japão já foi a terra do emprego vitalício, mas, enquanto muitas das pessoas mais velhas ainda desfrutam de estabilidade e benefícios generosos, quase 40% dos jovens japoneses não conseguem encontrar empregos estáveis.

A ansiedade causada por problemas financeiros e a instabilidade no trabalho é reforçada pela cultura japonesa de não reclamar. “Não há muitas formas de expressar raiva ou frustração no Japão”, diz Nishida. “Esta é uma sociedade muito orientada por regras. Jovens são moldados para se encaixar em nichos existentes. Não há como alguém expressar seus sentimentos verdadeiros. Se são pressionados por seu chefe ou se deprimem, alguns acham que a única saída é morrer.”

A tecnologia pode estar piorando essa situação, ao aumentar o isolamento dos jovens. O Japão é famoso por uma condição conhecida como “hikkimori”, um tipo de isolamento social grave. O jovem nessa situação pode se fechar completamente ao mundo, permanecendo em um quarto por meses ou mesmo anos. A maioria deles são homens. Mas essa é apenas a forma mais extrema de uma atual perda generalizada de socialização cara a cara. Uma pesquisa recente sobre o comportamento dos jovens em relacionamentos e sexo trouxe resultados impressionantes. Publicada em janeiro pela Associação de Planejamento Familiar do Japão, o estudo indicou que 20% dos homens com idades entre 25 e 29 anos tinham pouco ou nenhum interesse em relações sexuais. Nishida aponta para a internet e a influência da pornografia online sobre isso.

“Os jovens japoneses têm muito conhecimento, mas pouca experiência de vida. Não sabem como expressar suas emoções”, afirma Nishida. “Eles esqueceram como é tocar uma pessoa. Quando pensam sobre sexo, podem ficar ansiosos e sem saber como lidar com isso.”

E, quando jovens se encontram isolados e deprimidos, eles têm poucos lugares aos quais recorrer. Doenças mentais são um tabu no país, e a depressão é geralmente pouco compreendida. Quem sofre desse problema, normalmente tem medo de falar sobre o assunto.

O sistema de saúde para doenças mentais também é ruim. Faltam psiquiatras, e não há qualquer tradição desses profissionais trabalharem junto com psicólogos. Pessoas com problemas mentais podem receber prescrições de medicamentos psicotrópicos fortes, mas, com frequência, isso não vem acompanhado de um acompanhamento psicológico.

O próprio mercado de psicologia do Japão é uma bagunça. Ao contrário de outros países, não há um sistema de ensino estabelecido pelo governo nem para qualificação profissional de psicólogos clínicos. Qualquer um pode se apresentar como tal, e é muito difícil saber se quem presta esse tipo de serviço sabe o que está fazendo. [...]


Nota: O cristianismo não apenas coloca medo no suicida; ele dá sentido à vida e mostra que tecnologia, dinheiro, disciplina, tradição, etc. não são suficientes para uma vida plena. O verdadeiro cristianismo focaliza nossa relação com Deus e com o semelhante. Na verdade, a religião bíblica (judaico-cristã) já apresenta isso há milênios por meio de seus ensinamentos, e as próprias tábuas da lei resumem esse conceito em dez mandamentos: os quatro primeiros legislam sobre nossa relação com Deus, e os demais tratam de nossa relação com o próximo. Conforme as palavras de Jesus: Busquem em primeiro lugar o Reino de Deus e a sua justiça, e todas essas coisas lhes serão acrescentadas” (Mateus 6:33). Tão simples... Mas tanta gente complica. [MB]