quarta-feira, maio 08, 2013

Karen Armstrong fala sobre neoateísmo e sobre o papa

A escritora britânica Karen Armstrong, de 68 anos, escreveu livros em que denuncia o que ela chama de fundamentalismo religioso. Segundo ela, fundamentalistas cristãos são aqueles que creem na literalidade do livro de Gênesis, ou seja, os criacionistas. Ex-freira, Armstrong teve experiências negativas no convento, abandonou o hábito e estudou literatura na Universidade de Oxford. Depois disso, produziu documentários e escreveu livros que investigam a história das grandes tradições religiosas. “A ética da compaixão é o centro de todas essas grandes tradições, e é preciso retomá-la”, argumenta. Por e-mail, ela disse à Folha de S. Paulo que o ateísmo radical é produto do fundamentalismo e que está “encorajada” com os sinais de humildade do papa Francisco, embora não espere grandes mudanças. Leia alguns trechos aqui:

É comum ouvir dizer que, ao longo da história, o monoteísmo deu impulso à violência e à intolerância porque ele tende a ser exclusivista. A sra. concorda?

Não. Existem fundamentalistas entre os hindus e budistas. A história mostra que nenhuma fé consegue se transformar numa “religião mundial” se não for adotada por um Estado ou império dinâmico e em expansão. Como os Estados são inerentemente violentos (nenhum pode se dar ao luxo de acabar com seus exércitos), as religiões acabam adquirindo uma ideologia “imperial”. Mas os monoteísmos também desenvolveram uma alternativa contracultural não violenta. As pessoas é que são violentas, e não as abstrações que chamamos de “religiões”. [...]

Como a sra. enxerga o movimento dos Novos Ateus, que defende que os não crentes combatam de forma mais ativa a religião? É o sinal de um futuro cada vez mais secular?

O Novo Ateísmo é, em grande medida, um produto do fundamentalismo religioso, o qual tentou domesticar a transcendência de “Deus” e acabou por transformá-lo em algo inacreditável. Mas, ao longo da história, os monoteístas, por exemplo, insistiram que “Deus” não é um outro ser e que não podemos dizer que “ele” existe, porque nossa noção do que é a existência é limitada demais. Na verdade, as pessoas estão ficando enjoadas com [Richard] Dawkins [zoólogo britânico], [Sam] Harris [neurocientista americano; ambos são expoentes dos Novos Ateus], etc., porque eles são agressivos e intolerantes demais. Acho que a Europa está de fato destinada a seguir o caminho do secularismo, mas os EUA continuam sendo um país muito religioso.

Quais são suas impressões sobre o papa Francisco?

Achei muito encorajador quando fiquei sabendo que ele abandonou seu palácio e adotou um estilo de vida mais simples. Mas ele ainda é conservador do ponto de vista teológico e ético, então não espere muitas mudanças!

Vários papas, diante da pressão pelo sacerdócio de mulheres, afirmaram que teologicamente isso seria impossível, já que Jesus escolheu como apóstolos apenas homens. Como vê esse raciocínio?

Eu acho que Jesus ficaria surpreso ao ver qualquer tipo de sacerdócio no “cristianismo”. Os primeiros cristãos achavam que os sacerdotes só existiam no paganismo e no judaísmo; o modelo deles era mais igualitário.